Agência Senado – A pandemia da covid-19 acelerou a adesão de empresas e outras organizações ao teletrabalho. A seu ver, quais são as vantagens, desvantagens, oportunidades e riscos envolvidos nessa modalidade de atividade laboral?
Senador Fabiano Contarato: Quanto a desvantagens, sem a regularização adequada do teletrabalho, poderemos ter, por exemplo, problemas na questão da jornada de trabalho. O empregador poderá ver o rendimento do trabalhador cair. Também poderá ocorrer de o trabalhador ver-se obrigado a exceder suas horas diárias ou ser demandado a qualquer horário do dia, sem receber pelas horas extraordinárias trabalhadas. Temos, portanto, de ter regras mais claras para ambos. Dentre as vantagens, para o trabalhador, destaco, de imediato, ser importante para garantir a saúde em vista da pandemia, da necessidade de distanciamento e do isolamento social, ao máximo. Em outros aspectos, futuramente, pode diminuir a necessidade de a pessoa morar perto do trabalho, sendo que os centros empresariais, geralmente, ficam em regiões caras; pode reduzir o tempo despendido no trânsito, o que é bom para a pessoa e gera economia global para as cidades. Importante lembrar que a legislação brasileira não conta o tempo de deslocamento como tempo trabalhado. Assim, essa economia de tempo pode significar um ganho para cuidar da vida e da família. Para quem emprega, reduz os custos do espaço da empresa (aluguel e condomínio por exemplo). A melhora da qualidade de vida do empregado impacta para melhorar, também, a produtividade.
No projeto que o senhor apresentou há algumas cláusulas que foram recentemente negadas pelo Tribunal Superior do Trabalho (TST), no bojo de uma ação movida pelos petroleiros contra a Petrobras. Segundo a desembargadora Glaucia Braga, não há como calcular individualmente os gastos dos empregados com dados e energia elétrica, para fins de ressarcimento, já que outras atividades relacionadas com internet e consumo de energia ocorrem na residência ao mesmo tempo que o teletrabalho. A ministra também reconheceu como ilegítimo o pedido do sindicato para que a empresa custeasse, e em tempo recorde, todos os equipamentos e móveis necessários à realização do teletrabalho. Cada empregado deve ter a sua situação examinada pela empresa. Como o senhor vê essa decisão judicial e quais são as chances que o Parlamento tem de aprovar sua proposta?
Essa decisão que você cita foi feita com base na Medida Provisória nº 927, de 2020, que agora caducou. Na sua vigência, no entanto, o art. 4º, § 3º, tem disposição similar à do art. 75-D da CLT, que não cria uma obrigação de o empregador fornecer infraestrutura ou de o trabalhador ser reembolsado pelas despesas relacionadas ao trabalho remoto. O artigo apenas prevê que essas questões serão previstas em contrato escrito, sendo que o trabalhador é a parte mais vulnerável da relação trabalhista. Injusto! Portanto, proponho a alteração do art. 75-D, para obrigar o empregador a fornecer infraestrutura adequada, garantindo a segurança e a saúde do trabalhador, bem como reembolsar o trabalhador pelas despesas efetuadas. A infraestrutura só será dispensada por acordo coletivo e não individual, para fortalecer a posição do trabalhador diante da negociação com o empregador. Por fim, temos de pensar que, hoje, a própria tecnologia pode ser aliada para equilibrar a medição de despesas e validar reembolsos.
O teletrabalho está sendo implantado num contexto mais geral de digitalização do trabalho (onde é possível) e da economia e da vida humana como um todo. Na chamada economia 4.0 ou sociedade digital, vários tipos de interação dos seres humanos com a tecnologia têm se intensificado e isso repercute direta ou indiretamente na relação dos indivíduos com a produção, a divulgação, a venda e, claro, com a lucratividade dos negócios. A própria participação em redes sociais sempre foi mais do que mero entretenimento ou canal de manifestação cultural e política. Se a utilização dos dados pessoais dos internautas para a montagem de estratégias empresariais já é, em si, uma realidade preocupante, o que dizer da diluição do trabalho em uma série de entradas no sistema de telecomunicações (redes sociais, aplicativos de mensagens, etc.)? Como evitar que o trabalho em tese não caracterizado como trabalho acabe sendo aproveitado de maneira pouco clara e controlável em detrimento dos direitos dos trabalhadores?
O trabalho acompanha o avanço da tecnologia. Junto com essa evolução, a legislação deve se adaptar para proteger o trabalhador. As redes sociais e os serviços de mensagens já são considerados ferramentas de trabalho. Ninguém questiona, por exemplo, a importância do WhatsApp nas comunicações de trabalho. O que importa é que a empresa respeite a jornada de trabalho do empregado, de forma que não o obrigue a ficar conectado fora do período pactuado. Isso é o que eu proponho no meu projeto de lei. Inclusive trato do pagamento de horas extraordinárias. Acabada a jornada de trabalho, o empregado deve ter o chamado direito à desconexão, ou seja, ele não pode estar a todo momento disponível para o empregador. Caso contrário, o excesso de disponibilidade pode gerar o esgotamento ou a estafa do trabalhador, o que é extremamente prejudicial a sua integridade física e mental.