Este é um momento decisivo para a McLaren Automotive. Ainda não se passaram dez anos desde o lançamento do seu primeiro modelo — o 12C, em 2011 — e a marca já trabalha para se reinventar. Com a queda nas vendas devido à pandemia, reduções importantes vêm sendo preparadas (tanto nas instalações como no número de funcionários), ao mesmo tempo que a linha de montagem de Woking, na Inglaterra, está prestes a começar a produzir os próprios chassis tubulares de fibra de carbono. Os engenheiros trabalham ainda no desenvolvimento do motor V6 híbrido, o primeiro de uma gama que será totalmente eletrificada (a rendição à propulsão elétrica não é uma questão de “se”, mas de “quando”).

LT significa Longtail, ou Cauda Longa, e é o quinto carro da era moderna na marca inglesa que presta tributo ao F1 com traseira alongada traçado por Gordon Murray em 1997. O 765 LT é, por isso, um dos últimos representantes “old school” da McLaren apenas com motor térmico, como sempre um V8 (agora 4.0), que recebeu alguns “pozinhos mágicos”.

Fim de uma era: este será um dos últimos McLaren sem propulsão eletrificada — Foto: Divulgação

A essência dessas versões é fácil de explicar: redução de peso, suspensão alterada para melhorar o comportamento e aerodinâmica aperfeiçoada às custas de uma asa mais comprida e de uma dianteira também alongada. Uma receita respeitada quase duas décadas mais tarde, em 2015, com o 675 LT Coupé e Spider; no ano passado, com o 600 LT Coupé e Spider; e, agora, com o 765 em versão “fechada” (dentro de um ano será revelado o conversível).

McLaren 765 LT tem quatro saídas de escape unidas — Foto: Divulgação

O desafio de superação era enorme, já que o 720S deixou um parâmetro bem alto. Mas o 765 LT acabou por ser coroado de êxito, a começar pela redução do peso total em nada menos do que 80 kg (ele pesa somente 1.229 kg, ou menos 50 kg que seu rival direto mais leve, a Ferrari 488 Pista). Como foi feita essa dieta? Andreas Bareis, diretor da linha de modelos Super Series da McLaren, responde: “Mais componentes de fibra de carbono na carroceria, no túnel central, no piso do carro e nos bancos de competição; sistema de escape de titânio (3,8 kg mais leve que os de aço), materiais da F1 aplicados na transmissão, revestimento total do interior de Alcantara, rodas e pneus Pirelli Trofeo R ainda mais leves (22 kg) e superfícies envidraçadas de policarbonato (0,8 mm mais finas). Também abdicamos do rádio (1,5 kg) e do ar-condicionado (10 kg)”.

Interior tem mais fibra de carbono do que qualquer coisa e revestimento de Alcantara — Foto: Divulgação

Esse trabalho de emagrecimento foi determinante para que o 765 pudesse se orgulhar de ter uma quase inverossímil relação peso/potência de 1,6 kg/cv, que se traduz em desempenho ainda mais alucinante: zero a 100 km/h em 2,8 s, zero a 200 km/h em 7 s e velocidade máxima de 330 km/h.

O cenário competitivo confirma a excelência desses números de desempenho, e se a arrancada até os 100 km/h num piscar de olhos é equivalente ao de Ferrari 488 Pista, Lamborghini Aventador SVJ e Porsche 911 GT2 RS, os 200 km/h são alcançados 0,6 s, 1,6 s e 1,3 s antes, respectivamente, do que a trinca de rivais de respeito.

Seja lá qual for o pedal que você pisar, as respostas do McLaren são alucinantes — Foto: Divulgação

O segredo para essa marca tem a ver, mais uma vez, com várias melhorias, como explica Bareis: “Fomos buscar os pistões de alumínio forjado do McLaren Senna, conseguimos uma contrapressão de escape mais baixa para aumentar a potência no regime máximo de rotações e otimizamos em 15% a aceleração em rotações intermediárias”.

Redução de peso foi aplicada em massa na cabine, com bancos esportivos mais leves e retirada do ar-condicionado — Foto: Divulgação

No chassi foram igualmente introduzidas melhorias, apenas de afinação no caso da direção hidráulica e mais importantes nos eixos e na suspensão (“não mudamos um sistema a não ser que dê melhores resultados”). Na verdade, os McLaren podem viver sem sistemas de assistência ao motorista que necessitam de eletricidade. A altura do solo foi diminuída em 5 mm e as molas são mais leves e foram reforçadas, o que resultou em mais estabilidade e maior aderência. Segundo o engenheiro-chefe da McLaren, “ao inclinar o carro para a frente e dar-lhe mais largura, aumentamos a aderência mecânica”, explica.

Portas tipo borboleta deixam à mostra as soleiras de fibra de carbono — Foto: Divulgação

Tão ou mais importante para o melhorado comportamento foi o progresso feito na aerodinâmica, porque não só influiu na capacidade de colocar potência no chão como teve efeitos positivos na velocidade máxima e na frenagem do 765. Os spoilers dianteiro e traseiro são mais longos e, em conjunto com o piso de fibra de carbono, as lâminas nas portas e o difusor maior, permitem gerar pressão aerodinâmica 25% maior se comparada à do 720S. O spoiler traseiro pode ser ajustado em três posições, sendo a estática 60 mm mais elevada que no 720S, o que, além de aumentar a pressão aerodinâmica, ajuda a melhorar a refrigeração do motor. Ao mesmo tempo, a funcionalidade de “frenagem pelo efeito do ar” reduz a tendência do carro de “mergulhar” em casos de paradas muito fortes.

Feito sobre a base do 720S, o 765 LT é igualmente equipado com Controle Proativo do Chassi, sistema que usa amortecedores hidráulicos interligados em cada extremidade do carro, abrindo mão de barras estabilizadoras, que recorre a 12 sensores adicionais (inclusive um acelerômetro em cada roda e dois sensores de pressão por amortecedor).

McLaren 765 LT – Com ótima relação peso/potência de 1.6 cv/kg, o McLaren 765 LT garante zero a 100 km/h em 2,8 s — Foto: Divulgação

O 765 LT usa discos de freio de cerâmica com pinças “cedidas” pelo McLaren Senna. Uma tecnologia de refrigeração de pinças que deriva diretamente da F1 contribui para que sejam necessários menos de 110 metros para a frenagem completa a partir de 200 km/h.

E, claro, o “coração” é o motor V8 biturbo de 4 litros, que recebeu alguns dos ensinamentos e componentes do Senna para alcançar a potência máxima de 765 cv e 81,6 kgfm de torque, bem mais do que no 720S (que conta com menos 45 cv e menos 3,1 kgfm) e no 675 LT (que rende menos 90 cv e 10,2 kgfm). Além disso, há um ronco sonoro difundido de forma trovejante pelas quatro dramaticamente unidas ponteiras de escapamento feitas de titânio.

Apêndices incluem peças de aerodinâmica ativa, uma tecnologia que ajuda na hora das curvas e frenagens — Foto: Divulgação

A experiência ao volante do 765 LT foi realizada no conhecido circuito de Silverstone (sem testes feitos em estradas públicas), que nos recebeu às primeiras horas da manhã com alguns confiantes raios de sol que prometiam evaporar toda a umidade acumulada durante a noite fria. Quando me encaixo no banco esportivo do motorista recordo que a limitação de movimentos causada pelo cinto torna especialmente útil a elevação do console central e também a fita presa na porta para que seja possível fechá-la quase sem mover o corpo. Entre o polegar e os outros quatro dedos (protegidos por luvas) em cada mão tenho bem encaixado um volante sem botões à mostra, que só serve para o que foi originalmente criado: fazer girar as rodas.

Atrás do volante estão montadas as borboletas para as trocas de marchas (de fibra de carbono) e a instrumentação com dois mostradores ao lado de um grande tacômetro central (sendo possível variar a apresentação, como é norma nos mostradores digitais de hoje). Em pista até é informação demais, razão pela qual basta tocar um botão para fazer desaparecer o quadro de instrumentos, que se transforma em uma estreita faixa com dados residuais. Ao centro do minimalista quadro de instrumentos pode haver uma tela de 8” (que seria melhor se tivesse mais inclinação para o motorista, pois qualquer décimo de segundo que se ganhe para manter o olhar no circuito é bem-vindo) que permite controlar as funções do multimídia. À esquerda, os comandos rotativos para a seleção dos modos de condução Normal, Sport e Track, e o Handling, no qual também é possível desligar o controle de estabilidade, e o Powertrain. Entre os bancos fica o botão para ativar o launch control.

McLaren 765 LT consegue ir de 0 a 200 km/h em meros 7 segundos — Foto: Divulgação

Uma das caraterísticas mais comuns nos McLaren é a facilidade com que um motorista mediano consegue andar rápido e sentir que está fazendo algo bem-feito. Isso se deve à sua natureza de motor central, que equilibra as massas que costumam ser jogadas de um lado para o outro com grande brutalidade, especialmente nesses cenários de pista. Essa mesma sensação é experimentada aqui, independentemente de ser preciso recalibrar os nossos sentidos para a pressa com que tudo acontece ao volante do 765 LT, como os números mostram.

Motor V8 4.0 é praticamente o último da espécie: todos vão virar híbridos — Foto: Divulgação

Em curvas mais rápidas, como a de Woodcote, é possível sentir a transferência de massa para o exterior antes da entrada na reta. É preciso ser paciente até poder pisar fundo no acelerador de novo. Depois, em curvas mais fechadas — como a Stowe, no fim da reta Hangar —, percebe-se que o carro não se importa nem um pouco de abanar a cauda em sinal de felicidade canina se provocado para tal. O percurso exige alguma atenção e mãos firmes para voltar a colocar o carro direito, sendo as ajudas eletrônicas importantes pelo menos até saber como domar a fera (dá para ir tornando essas ajudas mais permissivas ou mesmo ausentes à medida que acumulamos voltas e que o conhecimento do traçado e do carro se torna mais marcante). Os pneus Pirelli Trofeo ajudam a manter o carro colado ao asfalto, mas quem não tem realmente a intenção de entrar em pista, mas sim de comprar o 765 LT como carro de coleção para passeios mais tranquilos em asfaltos, poderá preferir os opcionais P Zero. É que o esportivo está longe de ser um Senna, um carro de circuito ao qual é concedida autorização para circular por ruas públicas.

Como o nome sugere, a produção será limitada a 765 ferozes exemplares — Foto: Divulgação

O motor não tem a qualidade acústica de alguns Lamborghini, mas sua natureza de virabrequim plano torna o som um pouco mais metálico e com menos “carisma”, o que pode desagradar alguns potenciais proprietários. Os 81,6 kgfm de torque máximo são entregues gradualmente ao motorista, portanto a aceleração nunca é sentida como um soco no estômago.

Destaque para a potência de frenagem, sempre condizente com aquela sensação de que só um muito eficaz e competente carro “quase” de corrida consegue provocar: mesmo em necessidades urgentes de redução de velocidade, de 300 km/h para 130 km/h, enquanto o diabo esfrega o olho, o carro se mantém plantado, quase imperturbável e com a direção totalmente livre para definir a trajetória de curva com o motorista quase de pé sobre o pedal da esquerda. Intenso.

McLaren 765 LT

Ficha Técnica
Preço estimado: 380 mil euros
Motor: Central, longitudinal, 8 cilindros em V, 4.0, 32V, biturbo, gasolina
Potência: 765 cv a 7.500 rpm
Torque: 81,6 kgfm a 5.500 rpm
Câmbio: Automático, 7 marchas e tração traseira
Direção: Eletro-hidráulica
Suspensão: Triângulos sobrepostos de alumínio, amortecedores adaptativos (D e T)
Freios: Discos de carbono-cerâmica (D e T)
Pneus: 245/35 R19 (diant.) e 305/30 R20 (tras.)
Dimensões: Compr.: 4,60 m / Largura: 2,16 m / Altura: 1,19 m / Entre-eixos: 2,67 m
Tanque: 72 litros
Porta-malas: 150 litros (frente) e 210 litros (atrás)
Peso: 1.229 kg

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