Meses depois de realizar uma edição atípica, sem a presença de torcedores e com pilotos mantidos em “bolhas” para se protegerem do novo coronavírus, o Sertões, maior rali da América Latina, se prepara para um desafio adicional em 2021: promover a sustentabilidade, ao mesmo tempo que carros, motos, quadriciclos e utilitários multitarefas (UTVs, na sigla em inglês) levantam poeira, em meio a paisagens deslumbrantes. A 29ª edição do evento só começa em 13 de agosto, mas diversos profissionais já correm contra o tempo visando à estreia de um veículo híbrido (movido a etanol e baterias elétricas) e, portanto, benéfico para o meio ambiente.
O modelo menos poluente vem sendo desenvolvido pela Giaffone Racing, equipe com vasta experiência em categorias como a Stock Car, em parceria com a Companhia Brasileira de Metalurgia e Mineração (CBMM), a maior produtora global de nióbio, material que garante resistência, leveza, potência e economia de combustível. O UTV terá tração traseira à combustão e tração dianteira elétrica, com tempo de uso estimado em até duas horas e recarga de bateria de, no mínimo, sete horas. A expectativa é que o carro da Giaffone esteja pronto em maio, quando começa a Sertões Series, uma prévia do campeonato, afeita a testes minuciosos. É o primeiro passo rumo a um sonho ambicioso. “Queremos ter um rali 100% feito com tecnologias alternativas até 2025”, diz Joaquim Monteiro de Carvalho, CEO do Sertões. “É uma tendência natural do mercado, além de uma oportunidade para promover tecnologia brasileira de ponta.”
A organização promete entregar um “Sertões mais sertanejo”. Pela primeira vez, o campeonato será realizado inteiramente na Região Nordeste, valorizando a caatinga, único bioma 100% brasileiro, com largada no Rio Grande do Norte. Enquanto a pandemia não der trégua, a tendência é que novamente o evento ocorra em “bolhas”, com todos os envolvidos cumprindo um rígido protocolo que inclui exames constantes e isolamento controlado via satélite e patrulha aérea.
Ainda há esperança de que o evento seja aberto aos expedicionários, aqueles que realizam o trajeto sem participar da competição, parando em cachoeiras e parques nacionais — no ano passado, antes da pandemia, o número de turistas inscritos era maior do que o de competidores. “Com o dólar nas alturas e a demanda reprimida, o Sertões é um prato cheio para aventureiros que querem conhecer o próprio país”, afirma Monteiro.
O imenso potencial esportivo, social e turístico permite ao Sertões sonhar em se tornar o maior rali do mundo — hoje ele só perde para o Dakar. Em 2022, ano do bicentenário da Independência e que marcará a 30ª edição do evento, um trajeto especial atravessará todo o país, do Oiapoque ao Chuí, já possivelmente com uma categoria exclusiva para carros elétricos. A competição também já possui o selo Carbono Zero e realiza diversas ações louváveis (veja abaixo). São demandas da sociedade e da própria indústria automobilística, cada vez mais atenta ao movimento socioambiental. É um fato: o esporte a motor tende a ficar cada vez mais verde. “Ainda há quem se incomode com o fim do ronco dos motores, mas esse é o futuro”, admite Zequinha Giaffone, diretor da equipe brasileira. “Um dia ninguém mais se lembrará como era um motor a combustão.” O planeta agradece.
Publicado em VEJA de 7 de abril de 2021, edição nº 2732