“O futuro chegou”, foi a frase que mais escutei nos últimos dias, quando tive a oportunidade de testar o carro 100% elétrico mais barato do Brasil.
Na verdade, não tem nada de futurístico em um veículo movido a eletricidade, já que os primeiros carros da história já flertavam com motores elétricos. Só não eram viáveis, devido ao alto peso e custo das baterias, além da baixa autonomia e longas horas de recarga.
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Foram justamente esses pontos negativos que evoluíram ao longo dos últimos anos, graças ao avanço na tecnologia de softwares e matéria-prima das baterias.
Com isso, nunca um carro elétrico esteve tão acessível ao consumidor. Mas calma, ainda é caro. Muito caro, para falar a verdade. E não caia na conversa de que ficarão mais baratos, pois tudo leva a crer que isso não vai acontecer, pelo menos por aqui.
Fato é que, por cerca de R$ 165 mil, já é possível ser dono de um carro elétrico, mesmo preço de um Jeep Compass de entrada, que no ano passado foi o quinto modelo mais vendido do Brasil.
O elétrico em questão é o JAC E-JS1 e o comparativo com o Compass termina aqui. Fora o preço, não tem mais nada que possamos equiparar entre esses dois carros, tão distintos nas dimensões e nas propostas.
O E-JS1 é do porte de um Renault Kwid, que inclusive deve ganhar uma versão elétrica nos próximos meses para concorrer diretamente com o pequeno chinês da JAC.
A cor amarela do carro testado é o que mais chama atenção. Fosse a carroceria pintada em uma cor mais comum, como branco, preto ou prata, poderia passar tão despercebido como um Volkwagen up!, que certamente inspirou o design da dianteira do E-JS1. Não é coincidência, pois a VW é sócia da JAC e ajudou no desenvolvimento dele.
A plataforma é a mesma do finado JAC J2 e eles até compartilham as mesmas portas e teto. Com motor 1.4 a gasolina, o J2 era um foguetinho graças ao baixo peso, mas vendeu pouco e saiu de linha em 2018. No ano seguinte, a JAC resgatou o modelo com o nome iEV-20, já com motor elétrico e mudanças visuais. Agora é a vez do E-JS1, que a meu ver é o mais bonito de todos, e teve os ajustes finos da VW que deram mais credibilidade ao modelo.
Como anda
O carrinho é muito esperto, uma delícia de ser guiado no ciclo urbano. Precisa de apenas 10,7 s para chegar nos 100 km/h, o que é melhor que qualquer 1.0 aspirado do mercado. Mas ele impressiona mesmo é nas acelerações mais curtas típicas das vias urbanas, ou seja, cerca de 50 ou 60 km/h. Nessas condições, acelera mais do que a maioria dos carros.
É bom ter cuidado com os radares, pois não tem barulho de motor para sugerir que está indo rápido demais. Qualquer distração e o carrinho já está acima do limite das vias. Também é ótimo nas retomadas e no acerto das suspensões, que absorvem bem os impactos, fazendo do carro um bom companheiro de trabalho.
Na estrada, ele também vai bem, desde que o motorista não se esqueça de que a velocidade máxima é limitada em 110 km/h. Nem é tão ruim, dá para viajar numa boa nessa velocidade, o problema é precisar mais do que isso para ultrapassar algum carro. Precisa calcular bem para usar a faixa da esquerda.
Fiz uma pequena viagem para Sorocaba, que totalizou 220 km, e o carro surpreendeu. O silêncio a bordo é algo que nos deixa mal acostumados.
Como é por dentro
Não gostei da posição de dirigir, já que minhas pernas ficaram mais dobradas do que eu gostaria e meus braços mais esticados do que o recomendado. Entendo que, devido às baterias que ficam no assoalho, não tem como o banco ficar mais baixo, mas pelo menos o volante poderia ter ajuste de profundidade, algo que ajudaria bastante no conforto.
É ainda pior para quem vai atrás. O espaço para as pernas não é diferente do que se espera de um Mobi, Kwid ou up!, o problema é o espaço para os pés, quase inexistente. Apesar de ter três apoios de cabeça, não consigo imaginar três pessoas ali.
Definitivamente, é um carro para curtos trajetos, onde se passa pouco tempo dentro dele.
Quanto gasta
O principal argumento de venda de um veículo elétrico é o custo por quilômetro rodado, praticamente imbatível quando comparado com veículos a combustão. No meu caso, rodei 392,3 km e utilizei 183% de bateria. O leitor não leu errado, é que teve recargas nesse período. Como a bateria tem capacidade de 30,2 kWh, significa que foram gastos 55,3 kWh nesse período. Não cumpriu com a meta de 300 km de autonomia com uma carga, mas também não facilitei, já que não guiei em um modo econômico.
A não ser que você trabalhe em uma empresa de energia elétrica, não é fácil entender o quando pagamos por ela. Eu calculei a média das últimas doze contas de energia elétrica da casa onde moro e cheguei em R$ 0,96 por kWh. Multiplicando esse valor pelo que as baterias consumiram, chegamos a um custo de R$ 53,23.
Trazendo para a minha realidade, o meu carro de uso diário teria consumido uns 39 litros de gasolina, a um custo de R$ 255. Ou seja, o E-JS1 gastou cerca de 20% do que eu teria gasto com meu carro, uma baita economia. Seriam mais de R$ 5 mil economizados a cada 10 mil km rodados. Como isso varia bastante, convido o leitor a refazer os cálculos de acordo com a realidade de cada um, sempre considerando o consumo médio do seu carro e o custo do combustível na sua cidade.
Outras vantagens financeiras que devem ser consideradas: o baixo custo de manutenção, já que o motor não tem óleo, vela, correia e tantos outros componentes comuns em um motor a combustão (a JAC cobra pouco mais de R$ 2 mil nas revisões até 60 mil km).
O IPVA também costuma ser mais barato por ter incentivos. No Distrito Federal, por exemplo, carro híbridos e elétricos estão isentos do pagamento.
Quanto tempo leva para carregar
O site da JAC informa que a bateria do E-JS1 precisa de 10 horas para ser carregada por inteiro em uma tomada de 220V. Já o manual do carro, que pode ser baixado no mesmo site, informa 22 horas.
Com informações tão diversas, o jeito é ver na prática. Na tomada 220V da minha casa, levou 5 horas e 24 minutos para carregar 31% da bateria. Nesse ritmo, seriam 17 horas e 25 minutos para carregar a bateria do zero até o 100%.
Vale dizer que o E-JS1 tem uma das menores baterias do mercado. Por ser pequeno e relativamente leve, não precisa de mais do que isso. Os outros carros elétricos, com baterias maiores, vão precisar de ainda mais tempo para carregá-las por inteiro.
Na prática, dificilmente alguém vai chegar com a bateria zerada. Quem roda 100 km por dia, por exemplo, deve chegar em casa no fim do dia com mais de 50% de bateria e o tempo de recarga não será tão longo.
Vale a pena?
Não posso responder isso de uma maneira objetiva, pois as minhas necessidades são diferentes das de qualquer outra pessoa. O que posso afirmar é que esse tipo de carro não serve para a realidade da maioria dos brasileiros.
Em 2021, apenas 2.860 carros 100% elétricos foram emplacados no Brasil. O número não é ruim, bem melhor que os 801 carros do ano anterior, mas é irrisório perto da totalidade dos veículos emplacados. Ou seja, é um mercado para poucos, em que o preço nem é problema, já que o segundo elétrico mais vendido foi o caríssimo Porsche Taycan.
Eu teria um E-JS1 na minha garagem, mas jamais como único carro. Seria utilizado na maior parte das tarefas do dia a dia e descartado quando o objetivo fosse passear confortavelmente com minha família.
E também não faria contas de economia, pois seriam sempre desfavoráveis e frustrantes. Como já relatei, o custo por km rodado, IPVA e manutenção são baixos, mas levaria um tempão para que essa economia compensasse o investimento bem maior na compra do carro. Fora um possível aborrecimento na revenda, já que carros elétricos tendem a desvalorizar mais do que os a combustão no longo prazo.
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