Encher um tanque de 50 litros com gasolina em Belo Horizonte custa, em média, R$ 374, enquanto quem tem um carro elétrico da Tesla na capital estima não gastar mais de R$ 250 por mês com recargas para utilizá-lo todos os dias. Mas, se a troca parece tentadora, ela deixa de compensar porque carros elétricos ainda são artigos de luxo no país e o mais barato, entre os dez mais vendidos, custa quase R$ 250 mil, com modelos mais completos esbarrando em R$ 1 milhão.

Mesmo assim, a venda tem aumentado e, incluindo os veículos híbridos (que também aceitam gasolina), cresceram quase três vezes em relação a 2019, antes da pandemia, segundo levantamento da Associação Brasileira do Veículo Elétrico (ABVE). Muito antes de chegar à garagem da maior parte dos brasileiros, porém, a eletrificação se expandirá no transporte coletivo, na perspectiva de analistas do mercado, o que carece de mais incentivo do poder público para se concretizar. 

Em 2021, quase 35 mil veículos elétricos ou híbridos foram vendidos no Brasil, salto de 195% em relação a 2019, quando foram menos de 12 mil vendas. Este ano também promete uma escalada, já que as vendas do primeiro quadrimestre de 2022 tiveram um salto de 78% em comparação ao último ano. Os elétricos e híbridos, contudo, ainda são uma exceção, e representaram somente 2,5% do total de carros vendidos no país no primeiro quadrimestre. A expectativa da ABVE é que a frota nacional chegue a 100 mil eletrificados até o final do ano.

Com preços proibitivos para quase toda a população brasileira, a tecnologia não deve alcançar os carros mais populares tão cedo, porém o horizonte é otimista para o transporte coletivo, avalia a coordenadora do Laboratório de Estudos do Veículo Elétrico (Leve), da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Flávia Consoni. “Não é de um ano para o outro que toda a frota brasileira vai para a tomada. No nosso caso, reles mortais, a tecnologia ainda é muito cara. Na Noruega, onde eles são a maioria do mercado, o elétrico também custa mais caro, mas o governo dava subsídio para compra, o que não é nossa realidade e nem será. Para o transporte público urbano, é um cenário que está bastante definido e a eletrificação dos ônibus vai chegar, assim como entregas urbanas em furgões elétricos, por exemplo”, pontua. 

Essa é a experiência em importantes cidades latino-americanas, como Santiago, no Chile, e Bogotá, na Colômbia, que têm as maiores frotas de ônibus elétricos do mundo, fora da China. Em São Paulo, há a promessa de que 20% da frota seja de elétricos até 2024. Em Belo Horizonte, ainda não há planejamento para quando os 2.657 ônibus da capital serão substituídos por elétricos, entretanto a Prefeitura de BH (PBH) iniciou um teste, neste ano, com veículos-piloto, produzidos pela BYD em Campinas, para avaliar seus benefícios.

No caminho do progresso, falta um planejamento nacional sobre os rumos da eletrificação do país, sob risco de ficar para trás na economia global, na visão da professora Flávia Consoni. “Não temos definição do governo federal em relação à eletrificação. Não significa colocar o Brasil inteiro na eletrificação, não é nem prudente colocarmos a questão dessa forma, porque temos o etanol, um excelente combustível para menor emissão de CO², que é o objetivo. O que buscamos é reduzi-las, e não podemos ficar alheios ao que está acontecendo no mundo”, defende. Na Europa, por exemplo, pretende-se que carros novos com motor a combustão não sejam mais vendidos depois de 2035.  

Projetos em tramitação no Senado tentam incentivar a produção e a comercialização nacional de elétricos. Um deles foi aprovado pela Comissão de Ciência e Tecnologia (CCT) neste mês e obriga empresas beneficiadas por renúncias fiscais do programa federal para a indústria automotiva Rota 2030 a investir 1,5% do benefício tributário em pesquisas sobre eletrificação. Outro, que também precisa passar por comissões antes de seguir para a Câmara dos Deputados, quer zerar o Imposto de Importação dos elétricos até 2025. 

Fábrica de veículos elétricos e baterias em Nova Lima focará transporte coletivo

Longe do luxo dos carros elétricos pessoais, que podem chegar a preços milionários, a fábrica da Bravo Motor Company que será instalada em Nova Lima, na região metropolitana de Belo Horizonte, focará a produção de baterias e veículos para transporte coletivo, sob um investimento de R$ 25 bilhões. Após assinar um protocolo de intenções com o governo de Minas e receber isenções fiscais da prefeitura, a empresa estuda os trâmites para o licenciamento ambiental e deve começar a operar no segundo semestre, com expectativa de produção em escala após três anos. 

“Acreditamos em um futuro em que a mobilidade do dia a dia seja elétrica, compartilhada e, se possível, autônoma. Não acreditamos no veículo particular como solução para o problema que temos hoje”, pontua o CEO da empresa, Eduardo Javier Muñoz. Antes de produzir os veículos, a fábrica se especializará na produção de baterias de lítio, que também poderão ser fornecidas a outras empresas, segundo ele.

Hoje, a Agência Internacional de Energia (AIE) alerta para gargalos globais do fornecimento de lítio, essencial para as baterias, cuja capacidade de transformação e refino se concentra na China. Com a estabilidade global testada pela pandemia e pela guerra na Ucrânia, Muñoz avalia que Minas Gerais pode se tornar um polo latino-americano de produção de baterias de lítio no futuro. 

“Minas tem aço, tem tudo de que precisamos a poucos quilômetros de distância. Quando se compara à logística de qualquer fábrica pelo mundo, onde materiais vêm de muito longe, a logística em Minas, além de menor pegada de carbono, leva um ou dois dias a mais de caminhão para chegar [em caso de problemas], enquanto o que se pede da Ásia está demorando 60 dias”, conclui.

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