O nome é meio apelativo, “Moral Money”, ou dinheiro moral —como se todas as outras formas de riqueza fossem imorais. Começou como uma modalidade de investimento destinada a atrair as economias de pessoas dispostas a aceitar uma remuneração menor do seu capital em troca da paz de espírito proporcionada pela destinação, digamos com exagero, mas para efeito dramático, “caridosa” dos recursos. Media-se em milhões de dólares. Na semana que passou, o investimento prioritário em empresas comprometidas com causas sociais, ambientais e de boa governança corporativa, isso que os jornais de negócios dos Estados Unidos e da Inglaterra chamam de Moral Money, deu um passo gigantesco na direção de se tornar predominante no mundo das altas finanças. Saltou os bilhões e passou a ser medido em trilhões de dólares. O fato decisivo veio do anúncio da BlackRock, a maior empresa de gestão de recursos do mundo, com 7 trilhões de dólares em carteira, dinheiro equivalente a quase quatro vezes o PIB do Brasil e um terço do PIB dos Estados Unidos.

Mesmo com os cuidados que a gestão dessa quase inimaginável massa de dinheiro exige, Larry Fink, executivo-chefe da BlackRock, traçou os novos rumos com enorme clareza. Disse Fink na sua influente carta anual aos grandes empresários: “Empresas, investidores e governos devem se preparar para uma realocação significativa de capital. Nossa convicção é a de que portfólios vinculados à sustentabilidade e ao clima podem fornecer para os investidores os melhores retornos ajustados aos riscos. Acreditamos que o investimento sustentável é a base mais forte para as carteiras de clientes daqui para frente.” Na mesma carta, Fink anunciou que cortará do portfólio de investimentos da BlackRock as empresas nas quais mais de um quarto da matriz energética seja dependente de usinas térmicas a carvão.

A decisão da BlackRock tem um peso específico considerável e seria um erro grosseiro considerá-la como a adesão tardia do “capital culpado” a um modismo passageiro. Não. A montanha se moveu. E se moveu em consonância com o que o mundo real está demonstrando diariamente. Volkswagen, Mercedes-Benz, Porsche e Jaguar decidiram antecipar em uma década a decisão de não lançar a partir de 2020 nenhum modelo novo de carro que não seja elétrico ou híbrido. Na semana passada, a jetBlue, fundada pelo brasileiro naturalizado americano David Neeleman, dono da Azul no Brasil, tornou-se a última grande companhia aérea a aderir ao protocolo de compromisso com biocombustíveis. Essas empresas estão de olho em clientes jovens cada mais dispostos a fazer escolhas de consumo baseadas nas mesmas premissas que levaram a BlackRock a mudar de rumo mesmo sendo a maior e mais bem-sucedida gestora de fundos do mundo.

O fenômeno do dinheiro moral é tecnicamente conhecido como ESG, sigla em inglês para “ambiente, sustentabilidade e governança”. Quando se analisa o destino do capital no mundo na última década, na Europa principalmente, nenhuma outra mudança é mais expressiva do que a saída de recursos de portfólios tradicionais para os investimentos listados sob os índices ESG. Diz Fabio Barbosa, que, há 20 anos, quando presidia o Banco Real, foi pioneiro nesse tipo de investimento no Brasil: “Antes a escolha era entre obter alta rentabilidade ou investir com consciência social e ambiental. Agora as duas coisas andam juntas. O investimento ESG é também o sustentavelmente mais rentável”.

O mercado de ações no Brasil, mesmo batendo seguidos recordes, não tem atraído tanto capital estrangeiro quanto poderia. Os estrangeiros ainda respondem por 45% dos negócios na Bovespa, mas andam ariscos. Parte disso se deve à existência de oportunidades mais atraentes nas bolsas de Nova York e da Ásia e parte por terem levados sustos no passado recente, mas vale a pena um estudo mais aprofundado para descobrir o quanto as ondas de choque que mexeram com as fundações da BlackRock já impactam decisões de investimento externo no Brasil.

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