Os departamentos de marketing fazem o que podem para tentar vender os seus produtos como “jovens” e “frescos”, adjetivos a que o Honda Jazz não está fortemente associado desde que foi criada a sua primeira geração, em 2001.
Mas 19 anos e 7,5 milhões de unidades mais tarde é caso para dizer que existem outro tipo de argumentos que conquistam clientes: espaço interior amplo, funcionalidade dos bancos, condução “leve” e a proverbial fiabilidade deste modelo (sempre classificado entre os melhores nos índices europeus e norte-americanos).
Argumentos que têm sido suficientes para uma carreira comercial bastante relevante neste citadino verdadeiramente global. É produzido em nada menos do que 10 fábricas em oito países diferentes, de onde sai com dois nomes diferentes: Jazz e Fit (nas Américas, China e Japão); e agora com uma derivação com o sufixo Crosstar para uma versão com “tiques” de crossover, como não poderia deixar de ser.
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Interior feito de contrastes
Mesmo rendendo-se parcialmente à lei do crossover (no caso da nova versão Crosstar), o certo é que o Honda Jazz continua a ser uma oferta quase única neste segmento.
Os rivais são essencialmente hatchbacks de cinco portas (carroçarias de dois volumes), que procuram proporcionar o espaço possível dentro de uma forma exterior compacta, mas alguns deles, como o Ford Fiesta, o Volkswagen Polo ou o Peugeot 208, também a quererem seduzir clientes com dinâmicas bastante competentes, divertidas até. Não é o caso do Jazz que, melhorando em vários pontos nesta geração IV, mantém-se fiel aos seus princípios.
Quais? Silhueta de monovolume compacto (as proporções foram mantidas, tendo ganho 1,6 cm adicional em comprimento, 1 cm menos em altura e a mesma largura); interior campeão no espaço para pernas nos lugares traseiros, onde os bancos podem ser rebatidos para criar um fundo de carga totalmente plano ou até colocar os assentos na vertical (como nas salas de cinema) para criar um vão de carga enorme e, sobretudo, muito alto (dá para transportar até algumas máquinas de lavar roupa…).
O segredo, que continua a ser um dos principais trunfos de sempre do Jazz, é o avanço do depósito de gasolina para debaixo dos bancos dianteiros, que assim liberta toda aquela zona debaixo dos pés dos passageiros traseiros. O acesso a esta segunda fila também está entre os seus trunfos, porque não só as portas são grandes como o seu ângulo de abertura é amplo.
As críticas vão para a largura e para o volume do porta-bagagens (com os bancos traseiros levantados) que é de apenas 304 litros, marginalmente menos até do que no anterior Jazz (menos 6 litros), mas muito mais pequeno (menos 56 litros) do que nas versões não híbridas do antecessor — a bateria por baixo do piso da mala rouba espaço, e agora só existe como híbrido.
Por fim, também uma crítica para a largura do habitáculo, onde querer sentar mais de dois passageiros atrás não é claramente boa ideia (é dos piores na classe).
A posição de condução (e de todos os assentos) é mais alta do que nos rivais tipicamente hatchback, ainda que a Honda tenha aproximado a posição mais baixa dos mesmos do solo (em 1,4 cm). Os bancos viram o seu revestimento reforçado e os assentos são mais largos e o condutor goza de uma melhor visibilidade porque os pilares dianteiros são mais estreitos (de 11,6 cm para 5,5 cm) e as escovas do limpa para-brisas passaram a estar escondidas (quando não estão a atuar).
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Tetris cruza-se com Fortnite?
O tablier tem inspiração no do iminente elétrico Honda E, totalmente plano, e até o próprio volante de dois raios (que permite regulações mais amplas e tem uma posição dois graus mais vertical) é cedido pelo muito esperado mini urbano.
As versões de entrada dispõem de um ecrã central pequeno (5”), mas daí para cima todos têm o novo sistema multimédia Honda Connect, com ecrã de 9”, muito mais funcional e intuitivo (o que, convenhamos, não é difícil…) do que o habitual nesta marca japonesa.
Ligação Wi-Fi, compatibilidade (sem fios) com Apple CarPlay o Android Auto (de momento por cabo), comando vocal e ícones grandes para uma mais fácil utilização. Subsiste um ou outro comando com possível melhoria: é complicado desligar o sistema de manutenção de faixa de rodagem e o reóstato de luminosidade é grande demais. Mas não restam dúvidas de que foi um importante passo na direção certa.
A instrumentação está a cargo de um ecrã igualmente colorido e digital, mas com um grafismo que poderia ter saído de um jogo de consola dos anos 90 — Tetris cruza-se com Fortnite?.
Há, por outro lado, mais qualidade geral do que no anterior Jazz, na montagem e em alguns revestimentos, mas subsistem a maioria das superfícies em plástico de toque duro, longe do que de melhor existe nesta classe e até mesmo com preços bem inferiores.
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Híbrido, apenas híbrido
Como referi antes, o novo Honda Jazz só existe como híbrido (não recarregável) e é aplicação do sistema que a Honda estreou no CR-V, reduzido à escala. Aqui temos um motor a gasolina, de quatro cilindros, 1.5 l com 98 cv e 131 Nm que trabalha em ciclo Atkinson (mais eficiente) e com uma taxa de compressão muito mais alta do que o normal de 13,5:1, a meio caminho entre os 9:1 a 11:1 dos motores a gasolina em ciclo Otto e 15:1 a 18:1 dos Diesel.
Juntam-se um motor elétrico de 109 cv e 235 Nm e um segundo motor-gerador, e uma pequena bateria (menos de 1 kWh) de iões de lítio que asseguram os três modos de funcionamento que o “cérebro” do sistema vai intercalando de acordo com as condições da condução e a carga da bateria.
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Três modos de condução
O primeiro é o EV Drive (100% elétrico) em que o Honda Jazz e:HEV arranca e circula a baixas velocidades e carga de acelerador (a bateria fornece energia ao motor elétrico e o motor de gasolina está desligado).
O modo Hybrid Drive convoca o motor a gasolina, não para mover as rodas, mas para carregar o gerador que transforma a energia para enviar para o motor elétrico (e, se sobra, vai para a bateria também).
Finalmente, no modo Engine Drive — para condução em vias rápidas e maiores exigências dinâmicas — uma embraiagem permite ligar o motor a gasolina diretamente às rodas por meio de uma relação de engrenagem fixa (como uma caixa de uma só velocidade), que permite abdicar de uma transmissão de engrenagens planetárias (como noutros híbridos).
Nos casos de maior exigência por parte do condutor há um empurrão (“boost”) elétrico que se aprecia principalmente nas retomas de velocidade e que se nota muito bem, por exemplo, quando a bateria está sem carga e essa ajuda elétrica não acontece. A diferença é entre retomas de bom nível e medíocres — afinal de contas é um motor a gasolina atmosférico e que só “dá” 131 Nm —, com quase dois segundos de diferença na aceleração de 60 a 100 km/h, por exemplo.
Quando estamos no modo Engine Drive e abusamos da aceleração o ruído do motor torna-se demasiado audível, percebendo-se bem que o quatro cilindros está “em esforço”. A aceleração de 0 a 100 km/h em 9,4s e os 175 km/h de velocidade de ponta permitem dizer que o Jazz e:HEV consegue prestações medianas, sem motivos para entusiasmados aplausos.
Sobre esta transmissão, que os engenheiros japoneses chamam de e-CVT, convém referir que consegue gerar um maior paralelismo entre a velocidade de rotação do motor e do veículo (um defeito das caixas de variação contínua tradicionais, com o conhecido efeito de banda elástica, em que há muito barulho de rotações do motor e sem correspondência em resposta). O que, juntamente com a “imitação” de etapas, como se de mudanças de uma caixa automática comum se tratasse, acaba por resultar numa utilização bastante mais agradável, mesmo que ainda com margem para melhorar.
Plataforma mantida, mas melhorada
No chassis (suspensão dianteira McPherson e traseira com eixo de torção) foram feitas algumas alterações à plataforma que é herdada do anterior Jazz, nomeadamente com a nova estrutura em alumínio nos montantes dos amortecedores traseiros, além de ajustes nas molas, casquilhos e estabilizadora.
O aumento da rigidez (flexional e torsional) sem agravamento do peso deveu-se ao incremento exponencial de utilização de aços de elevada rigidez (mais 80%) e isso também se percebe pela integridade da carroçaria em curva e ao passar por maus pisos.
Em bom plano, nesse aspeto, mas menos por dar mostras de excesso de inclinação lateral da carroçaria se decidimos adotar ritmos mais rápidos em rotundas ou sucessões de curvas. Percebe-se que o conforto prevalece sobre a estabilidade (as proporções da carroçaria também condicionam), além de que as passagens por buracos ou elevações bruscas no asfalto se sentem e ouvem mais do que o desejável. Aqui e ali há uma ou outra perda de motricidade, o que acontece também pelo elevado binário máximo, ainda mais sendo elétrico, ou seja, entregue de uma assentada.
Os travões mostraram boa sensibilidade próximo do ponto de imobilização (o que nem sempre acontece nos híbridos), mas a potência de travagem não convenceu totalmente. Já a direção, agora com desmultiplicação variável, permite sentir mais a estrada, não se limitando a apontar as rodas na direção desejada, mas sempre bastante leve, dentro da filosofia geral de condução tranquila e sem esforço.
No trajeto do teste, que combinava estradas nacionais e autoestradas, este Honda Jazz rubricou uma média de 5,7 l/100 km, o que é um valor bastante aceitável, mesmo que superior ao registo de homologação (de 4,5 litros, mesmo assim superior ao das versões híbridas do Renault Clio e do Toyota Yaris).
Já o preço deste híbrido, que chegará em setembro a Portugal, será menos celebrado pelos potenciais interessados — estimamos um preço de entrada a tocar nos 25 mil euros (tecnologia híbrida não é a mais acessível) —, que a Honda gostaria que fossem de uma faixa etária mais jovem do que a habitual, ainda que a filosofia do carro não faça muito para que essa aspiração se materialize.
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Crosstar com “tiques” de crossover
Desejosa de cativar condutores mais jovens, a Honda avançou para uma versão diferenciada do Honda Jazz, com um visual influenciado pelo mundo crossover, superior altura ao solo e um interior melhorado.
Vamos por partes. Por fora temos uma grelha específica, barras no tejadilho — que pode, opcionalmente, ser pintado numa cor diferente do resto da carroçaria — há proteções de plástico negro no perímetro inferior a toda a volta da carroçaria, revestimentos dos estofos à prova de água, um sistema de som superior (com oito em vez de quatro altifalantes e também o dobro da potência de saída) e uma mais elevada altura ao solo (152 em vez de 136 mm).
É ligeiramente mais comprido e largo (devido às “embaladeiras”) e mais alto (barras no tejadilho…) e também a superior altura ao solo tem que ver com equipamentos diferenciados (e não por diferenças orgânicas), neste caso os pneus de mais alto perfil (60 em vez de 55) e pela jante de maior diâmetro (16″ em vez de 15”), havendo ainda uma pequena contribuição das molas de suspensão ligeiramente mais compridas. Daqui resulta um comportamento um pouco mais confortável e um pouco menos de estabilidade em curva. A física não dá tréguas.
O Crosstar perde, no entanto, em prestações (mais 0,4 s de 0 a 100 km/h e menos de 2 km/h de velocidade, além de desvantagens nas recuperações devido ao peso superior e aerodinâmica menos favorável) e em consumos (pelas mesmas razões). Tem ainda uma bagageira muito ligeiramente mais pequena (298 em vez de 304 litros) e será cerca de 5000 euros mais caro — uma diferença excessiva.
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Especificações técnicas
Honda Jazz e:HEV | |
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Motor de combustão | |
Arquitetura | 4 cilindros em linha |
Distribuição | 2 a.c.c./16 válvulas |
Alimentação | Inj. direta |
Taxa de Compressão | 13,5:1 |
Capacidade | 1498 cm3 |
Potência | 98 cv entre as 5500-6400 rpm |
Binário | 131 Nm entre as 4500-5000 rpm |
Motor elétrico | |
Potência | 109 cv |
Binário | 253 Nm |
Bateria | |
Química | Iões de Lítio |
Capacidade | Inferior a 1 kWh |
Transmissão | |
Tração | Dianteira |
Caixa de velocidades | Caixa redutora (uma velocidade) |
Chassis | |
Suspensão | FR: Independente do tipo MacPherson; TR: Semi-rígida (eixo de torção) |
Travões | FR: Discos ventilados; TR: Discos |
Direção | Assistência elétrica |
Nº voltas do volante | 2,51 |
Diâmetro de viragem | 10,1 m |
Dimensões e Capacidades | |
Comp. x Larg. x Alt. | 4044 mm x 1694 mm x 1526 mm |
Distância entre eixos | 2517 mm |
Capacidade da mala | 304-1205 l |
Capacidade do depósito | 40 l |
Peso | 1228-1246 kg |
Prestações e consumos | |
Velocidade máxima | 175 km/h |
0-100 km/h | 9,4s |
Consumo misto | 4,5 l/100 km |
Emissões CO2 | 102 g/km |
Autores: Joaquim Oliveira/Press-Inform.