Donos de um Wii U e fãs de longa data da Nintendo possivelmente se lembram do anúncio, na já longínqua E3 de 2011, de uma “parceria sem precedentes” entre a Electronic Arts e a Big N. Na época, a empresa japonesa se preparava para o lançamento do sucessor do Wii, que ocorreria no ano seguinte, e ter a bordo o apoio total de uma das maiores empresas da indústria poderia ser encarado como certeza de boa recepção do mercado.


Porém, como a história tristemente se encarregou de mostrar, tal parceria não durou muito tempo: por diversos motivos, dentre eles o imenso fracasso comercial do console de mesa da Nintendo, somente quatro jogos da EA foram lançados para o Wii U durante seu tempo no mercado. Muito pouco para uma empresa que possui em seu portfólio diversas propriedades consagradas, como FIFA, Mass Effect, Plants Vs. Zombies, Skate e Burnout; e, com certeza, uma frustração para os numerosos fãs dessas franquias.

Felizmente, para os donos de Switch, os tempos são outros: no mês passado a EA anunciou que lançará sete títulos, incluindo o sucesso Apex Legends, para o console híbrido nos próximos 12 meses. Burnout Paradise Remastered, a estrela desta análise, é um dos contemplados, e marca o aguardado retorno da série aos consoles da Nintendo após um longo hiato — são aproximadamente 15 anos desde Burnout Legends (DS). Mas será que tamanha espera valeu a pena, ou seria melhor ter deixado Paradise City no campo das memórias afetivas? Acelere conosco, caro(a) leitor(a), e descubra em nossa análise.

Memórias, memórias

Como dizem por aí, recordar é viver: a série Burnout data do início da década de 2000, e sempre se caracterizou por sua proposta arcade e descontraída. Ao contrário de outras franquias populares de corrida, como Gran Turismo e Forza Motorsport, que podem ser definidas como simuladores (ou, mais especificamente, simcades), aqui a ênfase está tanto em uma boa pilotagem como em grandes saltos em rampas mirabolantes; na busca constante por atalhos; e na destruição (assim que possível) dos veículos adversários.

Na prática, tem-se um meio termo entre jogos mais fantasiosos, como F-Zero e Mario Kart, e jogos mais sérios, como Grid Autosport e os simcades citados acima. No Switch, o exemplo mais próximo e recente dessa proposta é Asphalt 9: Legends (Switch), título free-to-play da Gameloft lançado no final do ano passado.

Apesar de não contar com carros licenciados, desde a sua concepção Burnout sempre arrancou diversos elogios dos jogadores por sua jogabilidade precisa, veloz e divertida. Embora muitos fãs defendam a crença de que Burnout 3: Takedown é a melhor iteração da série, Burnout Paradise — o sétimo título em ordem cronológica — inovou ao apresentar um mundo aberto para exploração, em vez de meras corridas em sequência. Além disso, o fato de Paradise ter sido projetado e lançado em alta definição para a geração passada o torna um candidato propício à seleção de remasterização para esta geração, o que nos leva ao próximo tópico: o jogo em si.

GPS, cadê você?

Após iniciar o jogo e ser recebido pela empolgante faixa tema do Guns ‘n’ Roses, você receberá sua identidade de motorista (mais sobre ela em breve) e seu primeiro carro. Como este último não está em boas condições, caberá a você conduzi-lo até a estação de reparo mais próxima antes de entrar em sua primeira corrida. Embora simples, esta pequena introdução já serve de iniciação às mecânicas de mundo aberto do título. Você deseja participar de algum evento, como uma corrida, ou mudar a pintura de seu veículo? Antes disso você precisará descobrir a localidade específica para tal em Paradise City.

É uma mecânica que promove e incentiva a exploração por parte do jogador, posto que qualquer evento ou ponto de interesse encontrado anteriormente ficará marcado no mapa para posterior visita. Corridas podem ser iniciadas segurando os botões ZL e ZR ao mesmo tempo, ao passo que para usar os serviços de postos de gasolina (que completam seu boost) ou de lojas de pintura, por exemplo, basta passar com o carro por essas localidades.

Particularmente, mundos abertos muito me agradam, mas cabe aqui ressaltar aquela que é minha única crítica contundente ao jogo: Burnout Paradise Remastered, assim como sua versão original, não permite ao jogador “marcar” uma localidade específica no mapa para visitação, como é característica de praticamente todo jogo open-world em 2020. Em 2008, ano de lançamento original do título, tal escolha era compreensível; nos dias atuais, onde temos títulos do gênero como Forza Horizon 4 e Need For Speed Heat também oferecendo mapas gigantes para exploração, não fornecer ao menos essa opção se configura muitas vezes em uma inconveniência desnecessária.

Como exemplo destas ocasiões, após uma série de vitórias, consegui desbloquear um novo carro para uso. Porém, por não conhecer o cenário a fundo, não consegui usá-lo até encontrar um dos cinco ferros-velhos (Junkyards) espalhados por Paradise City. Do mesmo modo, em um certo momento de jogo, acabei desistindo de chegar a um evento de corrida do outro lado do mapa devido ao “trabalho” que teria para chegar lá sem marcações visíveis. Terminei por dar preferência a algo mais perto da minha localidade atual.

Uma pena, pois mesmo para os padrões atuais, Paradise City é um playground interessante e divertido: há áreas rurais, segmentos urbanos e rampas e atalhos diversos. A boa notícia é que com o tempo de jogo, é mais fácil se acostumar com as localidades incluídas — até porque, como citado, tudo ficará visível permanentemente no mapa uma vez que tenha sido descoberto. Logicamente, também, fãs do original se sentirão em casa. Jogadores novos ou mais casuais, porém, poderão estranhar essa escolha criativa.

A estrada do sucesso

No que tange às corridas em si, o objetivo continua sendo o primeiro lugar, mas há um bem-vindo foco na liberdade: em Burnout Paradise Remastered, muitas vezes não haverá uma única maneira de alcançar a linha de chegada. Como não há checkpoints durante muitas corridas, o jogador é livre para buscar atalhos e caminhos alternativos para garantir a vitória. Claro, não há garantia que rotas diferentes sejam a melhor opção sempre, mas esse elemento do design, juntamente com o sistema de risco e recompensa que o acompanha, é um dos pontos altos de Paradise.

Ao correr, você poderá forçar seus adversários contra obstáculos, como paredes ou outros veículos, e, caso consiga destruí-los (o chamado takedown), ganhará o tão importante impulso (boost), cuja aplicação varia de carro para carro e pode ser usado com o botão B. Também é possível ganhar impulso usando derrapagens e saltos ou dirigindo de maneira ousada, como em alta velocidade ou na contramão.

Desse modo, mesmo dois eventos similares podem se desenvolver de maneira completamente diferente, e, como pode ser visto pela descrição, cada corrida em Burnout Paradise Remastered se torna um espetáculo veloz e divertido, amplificado pela variedade de cenários e pelos largamente estáveis 60 quadros por segundo. É difícil não sorrir quando se consegue uma sequência de takedowns ou se ganha uma corrida por uma rota alternativa. Ponto positivo para a desenvolvedora Criterion, pois Paradise ainda consegue entreter mesmo tantos anos depois de seu lançamento original — uma tarefa difícil em um gênero competitivo.

A progressão no jogo está diretamente relacionada à identidade de motorista obtida no início. Cada vitória conquistada contribui para a classe de seu documento (a última, e que necessitará de muito trabalho para ser alcançada, é a Criterion Elite). Conforme se avança nesse quesito, novos carros são liberados e as corridas ficam mais difíceis. É uma abordagem simples, porém funcional, que fornece um senso de direção ao jogador ao mesmo tempo em que remonta à necessidade de exploração para descobrir novas corridas e eventos. 

Por falar em eventos, há boa variedade destes, e as atividades propostas muitas vezes são tão ou mais divertidas que as corridas propriamente ditas. No Marked Man, por exemplo, o objetivo é chegar com o carro inteiro até a área marcada, desviando ou enfrentando a inteligência artificial do jogo; já no Road Rage, o objetivo é conseguir um determinado número de takedowns no tempo estabelecido, e por aí vai. Se parece muito, ainda há mais; e nem comentamos o número de colecionáveis destrutíveis, como placas e outdoors espalhados pela cidade.

Assim sendo, há bastante conteúdo entre o jogo base e as expansões inclusas (destaque para a Big Surf Island, nova ilha, e Burnout Bikes, que adiciona motos e aproximadamente sete horas de conteúdo single-player). Vale a pena reforçar que, como esta é uma remasterização, é possível acessar os conteúdos de DLC a qualquer momento, o que significa que é possível usar alguns dos carros lendários ou as motos desde o início, se assim o jogador desejar.

No aspecto técnico, Burnout Paradise Remastered não decepciona, especialmente em modo portátil, onde opera em resolução nativa. Texturas e efeitos passaram por um leve upgrade em comparação com as versões de PS3 e Xbox 360, e, de modo geral, este ainda é um jogo bonito, especialmente no pôr-do-sol (é possível selecionar o quanto os dias duram). A trilha sonora enérgica, com faixas de bandas como Jane’s Addiction, Alice in Chains, Twisted Sister e Jimmy Eat World também merece ser mencionada.

Take me down to Paradise City

Como fã de jogos de corrida, confesso que a adaptação de Burnout Paradise Remastered para Switch era, para mim, um dos jogos mais aguardados deste ano. Particularmente, muito me agrada usar o Switch em modo portátil, e poucos gêneros se adaptam tão bem a esse modo de jogo como corrida. A possibilidade de enfrentar oponentes online ou correr contra a inteligência artificial em um evento/campeonato com facilidade em diversos intervalos, sejam estes ao longo do dia ou da noite, é um dos motivos pelos quais títulos como Mario Kart 8 Deluxe (Switch) e o já citado Asphalt 9: Legends não saem do meu console. 

Também por isso, como grande parte da comunidade, estranhei a ausência do Switch no anúncio e lançamento original desta remasterização, que ocorreu em 2018 para outros consoles. Sendo um jogo originalmente projetado para dispositivos da geração passada, mesmo levando em conta as diferenças de arquitetura, o console da Nintendo certamente daria conta da tarefa de nos transportar, mais uma vez, à bela Paradise City. 

Não obstante, finalmente agora temos essa possibilidade. Embora a exploração livre possa se mostrar ocasionalmente obtusa, a conversão técnica é bem realizada, e correr por esta cidade fictícia é empolgante e divertido, mesmo tantos anos depois. Pela liberdade e pela experiência arcade genuína concedida, portanto, Burnout Paradise Remastered merece a recomendação como uma das mais oportunas conversões da última geração, ainda que tardia, e uma bela adição à crescente biblioteca de jogos de corrida do Switch.

Prós

  • Jogabilidade divertida, característica da série Burnout;
  • Mundo aberto com diversos eventos e colecionáveis;
  • Bom número de veículos;
  • DLCs prolongam as horas de jogo;
  • Realizar takedowns ainda é muito divertido.

Contras

  • Ausência de sistema de marcação de pontos de interesse;
  • Navegação pode ser confusa;
  • Ausência de suporte a português brasileiro;
  • Remasterização poderia ser mais ousada, trazendo conteúdo original.

  Burnout Paradise Remastered – Switch/PC/PS4/Xbox One – Nota: 8.5 
Versão utilizada para análise: Switch

Revisão: Jorge Neto
Análise produzida com cópia digital cedida pela Nintendo
Burnout Paradise Remastered está disponível na Loja Nintendo



LEAVE A REPLY

Please enter your comment!
Please enter your name here