A notícia de que uma empresa de nome Qell Latam está chegando ao mercado para estruturar investimentos em mobilidade veicular apostando no etanol não diria muita coisa para um mercado local que a desconhece. Mas com os nomes de seus sócios é outra história.
E tem potencial para mexer com o status atual do mercado assim que a subsidiária da Qell Acquisition Corp, listada na Nasdaq desde 2020, detalhar seus planos e mostrar avanços nas aquisições e investimentos baseados em private equity.
Franscisco Valim, ex-presidente da Via Varejo (VVAR4) e da Nextel, Carlos Zarlenga, ex da GM na América do sul, e Barry Engle, ex da GM International, anunciaram que estão dispostos a disputar o mercado de carros elétricos a célula de etanol. E ainda sem descartarem a participação na evolução do híbrido flex.
Algumas montadoras tradicionais também apostam nesse mercado, mas não descartam dividirem suas plataformas de produção com o elétrico a bateria recarregável. Ou até importarem de suas matrizes esses modelos elétricos puro-sangue.
Ou seja, por quaisquer caminhos desses, haveria limitação de mercado para os veículos movidos por célula de biocombustível. E, por tabela, para a expansão mais orgânica da produção de etanol.
“Eles [montadoras] seguem a manada e acabam substituídos por animais mais jovens e inovadores, que conseguem enxergar o futuro. É assim que eu vejo a entrada da Qell no Brasil e a sua aposta no etanol”, declara Gonçalo Pereira, pesquisador da Unicamp, e uma das vozes mais respeitadas no desenvolvimento e defesa do uso do renovável “sem fronteiras”.
Independentemente de poucos detalhes sobre o grupo estreante, “quando a bioeletrificação estiver pronta, o que não vai mais demorar, essa empresa estará extremamente bem posicionada, pronta para um longo período de bonança”, se entusiasma Pereira, que foi um dos fundadores da GranBio, pioneira no etanol de 2ª geração, e ex-diretor do Laboratório Nacional de Ciência e Tecnologia do Bioetanol (CTBE).
A Qell, conforme anúncio, se diz pronta para adquirir negócios de US$ 500 a US$ 3 bilhões, em companhias da cadeia automobilística da América Latina, e já estaria mirando um negócio no Brasil ainda para este ano. E se “estamos em outra condição e não tem ninguém focado em desenvolver veículos com uma tecnologia consagrada que nós temos [o etanol]”, como disse Valim, é porque o Brasil é o epicentro desse negócio.
Mas tem, sim. Apesar das limitações de avanços e de posicionamento do mercado, como foi dito acima, a Volkswagen, Toyota, Nissan e Honda estão bem avançadas e “essa nova empresa chega na mesma sintonia”, complementa Luiz Carlos Carvalho, presidente da consultoria Canaplan.
Para ele, a entrada de um player aumenta a competição no setor automotivo e aumenta o potencial para o futuro do etanol como matriz energética mais ampla, porque consolida o automóvel bioelétrico, como ainda mantém vida mais longa para o flex, já que o Ciclo Otto (carros a combustão) ainda terá muito mais tempo de permanência no mercado brasileiro do que nos países desenvolvidos.
“Ficamos muito satisfeitos com a iniciativa do Grupo Qell Acquisition Corp, que ao lado de outros importantes players e montadoras, como a Toyota, a Volkswagen e outras, estão enxergando o etanol como importante aliado ao processo de eletrificação”, informou Amaury Pekelman, presidente da União Nacional da Bioenergia (Udop).
E pela referência e tecnologia disponível no Brasil, em experiência de quatro décadas, a consolidação dessa e de outras empresas abre-se uma janela para a exportação. “O mundo só tem a ganhar com esta tecnologia e o Brasil poderá se tornar um grande fornecedor mundial de etanol, aliando ainda mais sustentabilidade aos motores elétricos”, diz Pekelman, também executivo do Grupo Atvos.
A Unica, a outra entidade que agrega as usinas do Centro-Sul, evitou comentários diretos sobre a Qell, por aguardar mais detalhes de suas operações, mas a defesa do etanol como solução para os veículos elétricos é uma das bandeiras quanto à mobilidade sustentável e crescimento da produção de etanol.