As montadoras têm se apressado em mostrar o potencial de seus carros elétricos, mas, a cada evento no Brasil, torna-se notório que essa tecnologia será apenas complementar pelo menos até o fim da década.
Sempre que se fala no assunto, o velho conhecido etanol é mencionado como a alternativa viável.
Foi assim nesta terça-feira (28), quando Peugeot e Volkswagen apresentaram veículos elétricos prontos para rodar no Brasil. A nova realidade ainda é para poucos, e o país não vai acompanhar o ritmo da Europa e de parte dos Estados Unidos quando o assunto é eletrificação. Na visão das fabricantes, o caminho é outro.
“Aqui temos um grande recurso que é o etanol, e estamos também, como o resto do mundo, dando passos rumo à eletrificação”, disse Antonio Filosa, presidente do grupo Stellantis (que reúne marcas como Fiat, Jeep, Peugeot e Citroën) na América do Sul, durante o lançamento do compacto elétrico Peugeot e-208 GT.
O modelo custa R$ 245 mil, valor suficiente para comprar três unidades da versão Like 1.6 flex do mesmo carro (R$ 81 mil). É caro, mas está na mesma faixa de seus concorrentes diretos oferecidos no Brasil.
O preço dos carros que trocam o tanque por baterias também é um problema em nações que já estão mais avançadas no segmento, mas as questões no mercado nacional e em países da América do Sul, África e Ásia vão além disso.
Há problemas crônicos de fornecimento de energia e poucos pontos de recarga, além de não se falar em investimentos das matrizes para a produção local de carros que não queimam combustível. Entretanto, é aí que o atraso vira oportunidade de negócio.
Pablo Di Si, presidente da Volkswagen América do Sul, vê que a tecnologia flex pode virar “uma jabuticaba tipo exportação” e cita a Índia como exemplo de um futuro mercado.
“A Índia hoje é como o Brasil na década de 1970. A matriz energética deles é 70% a carvão, e são também o quarto maior importador de petróleo”, diz Pablo. Neste cenário, carros capazes de rodar com etanol, que chegarão àquele mercado em 2023, serão uma evolução e tanto.
“Nós temos tudo para vender carros, motores e câmbios, fora o conhecimento sobre o etanol”, afirma o executivo. “E ainda há África, a maior parte dos países são semelhantes ao Brasil, a cana-de-açúcar vai crescer facilmente.”
A empolgação com as possibilidades do etanol foi manifestada durante a apresentação de dois carros 100% elétricos.
A Volkswagen exibiu nesta terça os modelos iD3 e iD4, que serão vendidos no Brasil possivelmente a partir de 2022. Na Europa, são vistos como o único caminho para a marca. Aqui, serão complementares na estratégia de descarbonização.
Pablo diz que o etanol já propicia uma redução de 80% das emissões quando considerado seu ciclo de produção (“do poço à roda”) e o uso do carro.
A montadora terá também modelos com tecnologia híbrido flex, capazes de rodar com gasolina, álcool e eletricidade. A japonesa Toyota já oferece essa opção na linha Corolla e, assim como a concorrente alemã, está de olho no mercado indiano.
Segundo a Peugeot, o Brasil tem cerca de 700 pontos de recarga para veículos elétricos, com maior concentração nas capitais das regiões Sul e Sudeste.
O e-208 pode rodar aproximadamente 300 quilômetros em meio urbano e rodoviário até precisar de recarga, o que exige uma parada em uma viagem entre Rio de Janeiro e São Paulo. Há postos com tomadas no caminho, mas corredores do tipo ainda são uma exceção no país. Por isso é que o etanol é visto como a melhor alternativa para reduzir as emissões.
Um estudo feito pela Anfavea (associação das montadoras) em parceria com a consultoria BCG mostrou que o combustível de origem renovável é a alternativa mais realista para o Brasil. A projeção considera um aumento de 15 pontos percentuais no uso do etanol até 2035, seja o hidratado disponível nas bombas ou o anidro, que é misturado à gasolina. Isso permitiria reduzir em 12 milhões de toneladas de CO2 as emissões da frota circulante até 2035.
O ano de 2020 terminou com 3,1 milhões de veículos 100% elétricos vendidos no mundo e, segundo o portal de pesquisas Statista, 4,2% de todos os emplacamentos de veículos leves foram desse tipo.
A previsão é que, em 20 anos, metade dos automóveis vendidos no mundo não irá queimar nenhum tipo de combustível. A outra metade poderá ter os veículos flex e híbridos desenvolvidos no Brasil.