Tecnologia híbrida leve ou parcial está se popularizando no Brasil e sendo vendida como se fosse híbrida plena ou plug-in

Tornou-se batido dizer que a eletrificação é um caminho sem volta para a indústria automotiva, inclusive no Brasil. Eu mesmo já devo ter afirmado isso algumas vezes nesta coluna. Também já apontei que a oitava fase do Proconve, o programa que legisla sobre emissões veiculares no país, praticamente obrigará esse movimento nos próximos anos

Já se antecipando a isso, muitas fabricantes vêm apostando em modelos híbridos em nosso mercado. Só que aí está uma certa pegadinha, porque quando falamos em um veículo “híbrido”, isso pode significar muitas coisas.

Ele pode ser um híbrido com recarga externa (PHEV), geralmente dotado de um banco de baterias maior e uma dose razoável de autonomia para uso em modo 100% elétrico. O Jeep Compass 4xe e o novo Caoa Chery Tiggo 8 Pro Hybrid são exemplos. 

Ou, ainda, um híbrido pleno ou convencional (HEV), como os Toyota Corolla e Corolla Cross, que possuem uma bateria menor, mas um motor elétrico relativamente robusto, capaz de auxiliar o motor ou tracionar sozinho as rodas em diversas situações-chave de uso, como as arrancadas, momento em que mais se gasta combustível.

Alternadores potentes para chamar os carros de híbridos

Mas o tipo que mais vem despontando em nosso mercado, e que em breve estará espalhado por modelos mais populares de marcas generalistas, como Volkswagen – com a tecnologia eTSI – e Stellantis, é o chamado híbrido leve ou parcial (MHEV). Os novos Caoa Chery Tiggo 5X Pro Hybrid, Tiggo 7 Pro Hybrid e Arrizo 6 Pro Hybrid são dotados dessa tecnologia, assim como o recém-lançado Kia Sportage de quinta geração.

A controvérsia se dá porque, nesse tipo de sistema, a participação da eletricidade como substituta ou auxiliadora do motor a combustão na propulsão das rodas é ínfima. Trata-se de uma espécie de superalternador ligado ao virabrequim, à bateria de 12 Volts e a uma outra bateria, de 48 Volts, por correia.

Ele usa a energia do próprio motor para alimentar todo o conjunto elétrico do veículo, incluindo um pequeno motor elétrico, geralmente acoplado ao próprio motor a combustão ou até ao sistema de transmissão. Este último ajuda pontualmente nas acelerações, aliviando o consumo de combustível nessas horas.

No caso do Kia Sportage, o trem de força 1.6 turbo híbrido leve permitiu uma melhora de 32% em consumo, 8,7 km/l para 11,5 km/l com gasolina em ciclo urbano, segundo o Programa de Etiquetagem Veicular do Inmetro. A comparação é com o velho motor 2.0 aspirado flex das gerações anteriores.

Não é uma evolução de se jogar fora, mas também está longe dos mais de 20 km/l que se costuma alcançar em carros híbridos convencionais. É justamente por isso que, em inglês, esse tipo de produto é chamado mild hybrid ou MHEV, o que se traduz como híbrido parcial ou híbrido leve em nosso idioma. Eles não são híbridos plenos.

Jogada de marketing

Ocorre que muitas marcas vêm ocultando o “leve” ou o “parcial” ao denominar seus novos produtos “híbridos”. E nós, imprensa especializada, estamos comprando essa tática quase de olhos fechados. E aí, para o consumidor, fica mais difícil entender por que seu Sportage ou Tiggo 7 Pro “híbridos” mal passam de 10 km/l, enquanto o Corolla Cross do vizinho faz facilmente 18 km/l.

Outra parcela da culpa está, claro, na legislação brasileira. Em nosso país, qualquer veículo que atinja 2% de participação da energia elétrica enquanto fonte para tracionar as rodas pode ser considerado híbrido. E os modelos híbridos leves costumam superar esse parâmetro.

Por isso, enquanto um Mercedes-Benz C 200, que tem nota C em emissões gerais no PBVE, só usa gasolina e mal passa de 10 km/l, está isento de rodízio veicular na cidade de São Paulo (SP), um carro 1.0 flex que tem nota A, polui menos (ainda mais se abastecido com etanol) e faz 16 ou 17 km/l segue sendo proibido de rodar nos horários de pico por lá em um a cada cinco dias da semana útil. Faz algum sentido?

A essa altura, já deveríamos estar discutindo uma distinção legal entre as categorias de híbridos e híbridos leves, tanto para tributação quanto na questão de rodízio e eficiência energética. Como sei que isso é um sonho, já me dou por vencido: se vivemos em um país no qual SUVs que não são bem SUVs fazem um tremendo sucesso, por que não nos acostumarmos também aos híbridos que não são tão híbridos assim?


Leonardo Felix é jornalista especializado na área automobilística há 10 anos. Com passagens por UOL Carros, Quatro Rodas e, agora, como editor-chefe da Mobiauto, adora analisar e apurar os movimentos das fabricantes instaladas no país para antecipar tendências e futuros lançamentos.

*Este texto traz a opinião do autor e não reflete, necessariamente, o posicionamento editorial de Automotive Business

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