O câmbio automatizado de uma embreagem foi aposentado de vez esse ano deixando pouca saudade de suas hesitações e menor suavidade. Mas uma tecnologia inédita desenvolvida no Brasil pela Marelli pode trazer de volta o sistema com o conforto de um automático e menor consumo de combustível.
O sistema foi apresentado no 18º Simpósio SAE de Powertrain por Guilherme Allegre, engenheiro de pesquisa e desenvolvimento da Marelli e responsável pelo projeto. A tecnologia financiada pela Finep e BNDES foi aplicada em um Volkswagen Fox 1.0 I-Motion.
Sim, você não leu errado. Essa configuração nunca existiu oficialmente — o câmbio automatizado era ofertado apenas com motor 1.6 —, mas os engenheiros optaram pelo 1.0 12V de três cilindros por sua melhor eficiência energética e ocupar menos espaço no cofre do motor, facilitando a inclusão dos equipamentos associados à hibridização.
Sem parar
O câmbio automático convencional é mais suave porque praticamente não há interrupção da força do motor enviada às rodas. Mesmo durante as trocas de marcha o conversor de torque sempre fica conectado com o motor e a transmissão.
Já os automatizados funcionam como um câmbio manual: a embreagem é acionada a cada troca de marcha, fazendo com que o carro pare de acelerar por um curto período de tempo. Em arrancadas intensas, especialmente nas marchas mais curtas, essa interrupção gera uma oscilação horizontal na carroceria, que pode incomodar os passageiros.
Para solucionar isso a equipe de Allegre usou um conceito simples: usar um motor elétrico para continuar tracionando o carro durante as trocas de marcha. Então, na hora em que a embreagem é acionada, o propulsor extra passa a movimentar o veículo até que a marcha seja trocada e o motor a combustão possa voltar a tracionar o carro.
Na prática é como se o carro nunca parasse de acelerar, repetindo um comportamento já presente nos veículos elétricos, que quase nunca possuem câmbio e têm seus motores ligados diretamente às rodas. O motor extra usa a mesma tecnologia dos híbridos leves, com uma bateria pequena de íon-lítio para alimentar o propulsor.
O Fox foi equipado um acumulador de menos de 0,4 kWh — como referência, o Toyota Prius, que pode rodar por maiores distâncias e velocidades usando só eletricidade, tem uma bateria de 1,3 kWh. “O motor elétrico foi acoplado ao próprio câmbio, para otimizar o espaço no cofre”, explica Allegre.
O sistema, porém, não oferece o start-stop em alta velocidade comum nos veículos híbridos leves, pois não houve alteração no motor de arranque do 1.0. O ar-condicionado também é original, e precisaria de um compressor elétrico para manter o conforto na cabine quando o motor fosse desligado. No cofre a única adição além do circuito elétrico de 48V foi a inclusão de um circuito de arrefecimento extra para esfriar os equipamentos do sistema híbrido.
O projeto começou em 2017 e envolveu uma equipe de aproximadamente 20 pessoas. Segundo o executivo, o objetivo agora é apresentar a tecnologia para potenciais clientes, que poderiam usar a novidade para resolver dois problemas de uma só vez: oferecer um carro que troque as marchas sozinho mais barato que um automático convencional e, de quebra, consumir e poluir menos como um veículo híbrido leve.
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