Pense em poder usar eletricidade para gerar uma propulsão a plasma, sem a necessidade de enormes tanques de combustível — sim, semelhante ao que o Reator Arc faz nas armaduras do Homem de Ferro ou ao que Doc Brown construiu na DeLorean de De Volta Para o Futuro. Para, Jau Tang, professor da Universidade de Wuhan, isso está mais perto da realidade.
Seu invento usa micro-ondas para energizar o ar comprimido em um estado de plasma, disparando-o com um jato na sequência. Os motivos são nobres. “Essencialmente, o objetivo dessa tecnologia é tentar usar a eletricidade e o ar para substituir a gasolina. O aquecimento global é uma grande ameaça à civilização humana. Essa tecnologia sem combustível fóssil, usando plasma de ar de micro-ondas, pode ser uma solução”, detalhou Tang.
Ele acredita que, caso hajam investimentos e mais pesquisas em seu estudo, em dois anos a tecnologia pode ser capaz de alimentar drones e, em uma década, um avião. E mais: seria possível aplicá-la também no setor espacial e na indústria automotiva. “Acho que o motor a jato é mais eficiente que o motor elétrico; você poderia dirigir um carro em velocidades muito mais rápidas. É isso que tenho em mente: combinar o motor a jato de plasma com uma turbina para dirigir um carro”, disse — embora isso pudesse gerar um trânsito um tanto confuso, pois ninguém iria querer estar atrás do veículo desses e ser torrado por um jato de fogo.
Tang também imagina outras possibilidades, como armas de projéteis, barcos a motor e até um novo tipo de fogão para cozinhar. Ele já construiu um protótipo deste último, com uma tocha de plasma alimentada por ar de micro-ondas — mas faz tanto barulho que parece uma trovoada constante.
Se é tão incrível, por que ninguém está falando disso?
O criador da “propulsão elétrica a plasma” ocupou várias posições de professor, fez pesquisas nos Laboratórios Caltech e Bell, publicou dezenas de artigos amplamente citados, editou várias revistas científicas e ganhou vários prêmios. Ele possui uma patente nos Estados Unidos para um dispositivo chamado de “obturador síncrotron”, projetado para capturar elétrons que viajam perto da velocidade da luz.
Seu currículo traz estudos avançados e bem diferentes um do outro, como microscopia eletrônica em 4D, lasers de pontos quânticos, nanotecnologia, fotossíntese artificial, transições de fase e oscilação plasmônica em estado sólido. Tang diz que teve a ideia do propulsor de plasma quando estava tentando criar diamantes sintéticos. Ao fazer isso usando micro-ondas, começou a se perguntar se a mesma tecnologia poderia ser usada para produzir empuxo.
Acontece que, quando ele tornou isso público, no início de maio, a pandemia e, por incrível que pareça, o curioso nome do bebê de Elon Musk, X Æ A-12, ofuscaram quase que completamente sua invenção. Apenas alguns veículos especializados no tema, como New Atlas, Popular Mechanics e Ars Technica, chegaram a citar essa história, mas ninguém chegou a entrevistá-lo na época.
E essa ideia é realmente viável?
Se nos meios populares o “Tang Jet” não ficou conhecido, o mesmo não se pode dizer nos círculos científicos, que passaram a olhar com cuidado para esse conceito. Michael Heil, engenheiro aeroespacial e de propulsão aposentado da Força Aérea dos Estados Unidos e da NASA, disse ao Futurism que essa pesquisa de o lembra de várias outras tentativas de construir tecnologia de propulsão a ar ao longo de sua carreira.
Propulsores de plasma como os que acionariam um Tang Jet, na verdade, já existem há algum tempo. A NASA lançou um satélite equipado com propulsores de plasma em 2006, mas suas capacidades estão muito longe do que Tang está propondo com sua pesquisa. Engenheiros há muito tempo sonham com um avião a jato de plasma, mas todas as tentativas anteriores fracassaram devido a limitações tecnológicas. Por exemplo, a New Scientist relatou em 2017 que uma equipe da Universidade Técnica de Berlim tentou construir um propulsor semelhante, mas, como os esforços vistos na década anterior, o trabalho nunca se concretizou fora do laboratório.
O conceito de gerar empuxo com uma tocha de plasma é bastante sólido, o problema é que a logística para a construção de um veículo para isso torna o projeto inviável. Tang não tem interesse em ganhar dinheiro com isso, apenas quer o reconhecimento pela descoberta e também inspirar líderes e gigantes da indústria a abraçarem sua ideia. Por isso, ele talvez não pense em realmente como sua propulsão a plasma seria aplicada em um modelo econômico sustentável.
“Os passos para a realização de um motor a jato de plasma cheio custariam muito dinheiro, tempo e energia. Esse investimento está além dos nossos recursos atuais. Essas tarefas devem ser realizadas por indústrias aeroespaciais ou agências governamentais”, afirmou Heil. Christopher Combs, pesquisador de aerodinâmica da Universidade do Texas em San Antonio concorda. “É isso que nós acadêmicos fazemos, descobrimos a física e dizemos ‘Bem, não quero fazer um produto’. É meio comum ver pessoas na academia que tiveram algo que chama muita atenção.”
Segundo Combs, é improvável que o projeto atinja a proporção necessária para levantar um avião. Aliás, essa tem sido a principal razão pela qual as tentativas de propulsão a plasma anteriores falharam. O protótipo atual do Tang Jet produz apenas cerca de 10 Newtons de empuxo, quase o mesmo que um modelo de foguete de tamanho médio. “Você está falando sobre escalar algo em cinco ordens de magnitude — mais de 100 mil vezes!”, afirmou
Além disso, há a questão da potência e armazenamento. O Reator Arc é uma peça muito compacta e poderosa no traje do Homem de Ferro, assim como o “Mr. Fusion” do Delorean. Ambos conseguem criar gigawatts, mas só existem na ficção. Os combustíveis fósseis armazenam muito mais energia em peso do que as baterias, e é improvável que isso mude tão cedo. E isso o Tang Jet precisa de muita energia.
Segundo um artigo que Tang e seus colaboradores publicaram sobre o protótipo do propulsor na revista AIP Advances em maio, a tecnologia produz cerca de 28 Newtons de empuxo por quilowatt de energia. Os motores do Airbus A320, um jato comercial comum, produzem cerca de 220 mil Newtons de empuxo combinados, o que significa que um avião a jato de tamanho comparável movido pelos Tang Jets exigiria mais de 7,8 mil quilowatts. Isso seria o mesmo que carregar uma aeronave com mais de 570 unidades de baterias Tesla Powerwall 2 por uma única hora de voo — essa carga seria impraticável, pois um Airbus A320 só pode transportar cerca de 130 unidades. Ou seja, nenhuma bateria existente poderia fornecer tamanha energia.
Baterias mais poderosas podem viabilizar o projeto
Tang sabe disso e aposta em melhorias na tecnologia de baterias nos próximos anos e décadas. Pesquisadores da Universidade Técnica de Berlim especularam uma solução com fusão nuclear, mas as respostas podem demorar décadas. Vale ressaltar que existem reatores de fissão nuclear compactos, como o KLT-40S da Rússia, que produzem energia suficiente e pesam pouco — e poderiam ser utilizados em avião de passageiros ou foguetes.
Mas as implicações ambientais e de segurança de aeronaves movidas a energia nuclear são delicadas, e Heil lembrou que gerar energia suficiente não é o único problema enfrentado pelo Tang Jet. Levar a eletricidade da fonte para os propulsores exige materiais supercondutores que ainda não existem. “Você precisa de energia para gerar impulso. E como você move esse poder no interior da aeronave? Mover e controlar megawatts do reator para o jato é um grande desafio. Você precisa usar fios de cobre grandes e grossos, que agregam muito peso”, destacou.
Ainda assim, Combs e Heil disseram estar fascinados com a pesquisa e esperavam ver progressos no futuro. Ambos acreditam que não teremos uma utilidade realmente prática para o Tang Jet enquanto o inventor e seu grupo avalie e experimentem melhor essa ideia. “Estou torcendo por isso e adoraria ver tudo acontecer. Mas o cientista em mim tem algumas perguntas e algumas preocupações”, complementou Combs.
Fonte: Futurism