Única marca que ainda consegue obter vendas relevantes no segmento de sedãs médios, com o Corolla, a Toyota se prepara para entrar na categoria mais badalada do Brasil, a de SUVs compactos. O eleito, porém, não é o C-HR, representante da marca para o mercado europeu e que chegou a ser estudado para o Brasil.
O modelo que dará base ao SUV nacional da Toyota é o Raize, projeto que, como o Etios, surgiu no mercado indiano. Sendo assim, será que este SUV vem, em 2021, com força para entrar na briga pela liderança com Nissan Kicks, Hyundai Creta, Jeep Renegade, Volkswagen T-Cross, Honda HR-V e, possivelmente, Chevrolet Tracker?
Ou, assim como os mais recentes lançamentos inéditos da Toyota, Etios e Yaris, ele vai ocupar uma posição de coadjuvante em sua categoria? A pergunta pode parecer absurda quando se observa o contínuo sucesso do Corolla, que vende mais que a soma dos principais rivais (Civic, Cruze e Jetta).
Também chama a atenção a liderança inabalável da Hilux entre as picapes médias. Já o SW4, SUV de quase R$ 200 mil, frequentemente aparece na lista dos 15 utilitários mais vendidos, à frente de diversos modelos compactos de R$ 80 mil.
Por outro lado, o debate surge por causa das carreiras não muito bem sucedidas das linhas Etios e Yaris, investimentos da Toyota em segmentos mais populares. E os SUVs compactos, apesar de terem preços iniciais em torno de R$ 80 mil, são mais conectados a compactos do que a sedãs médios como o Corolla. Ao menos, no caso da maioria das marcas.
Escola asiática
Projeto indiano de baixo custo, o Etios foi lançado no Brasil em 2012, quase junto com HB20 e Onix. Era o esperado Toyota para o segmento de entrada – que a marca vinha prometendo desde 2005.
A aceitação não foi boa. O cliente que sonhava com a manutenção barata e a fama de carro inquebrável dos Toyota não ficou convencido a levar o visual polêmico do Etios para casa. Nem suas estranhas soluções, como o quadro de instrumentos no centro do painel. Ainda mais em um contexto em que tinha à disposição a beleza do HB20 (o antigo) e a central multimídia do Onix, então exclusiva na categoria.
A Toyota até fez alguns ajustes na linha, investiu alto no custo-benefício e conseguiu colocar o hatch, durante alguns meses, na lista dos 20 mais vendidos. Mas o sucesso de verdade nunca veio.
Então chegou o Yaris, e uma nova decepção. O carro não era alinhado à versão europeia nem à japonesa. Mais uma vez, a Toyota recorria a países em desenvolvimento da Ásia, lançando no Brasil a versão tailandesa do carro.
Novamente, o sucesso não veio. O carro chegava bem menos atraente, na relação preço-equipamentos, que dois lançamentos recentes da categoria, Polo e Argo. O modelo, nem na versão hatch nem na sedã, jamais conseguiu entrar na categoria dos dez carros mais emplacados do Brasil, diferentemente do Volkswagen e do Fiat, que passaram a fazer parte do grupo quase instantaneamente, após o lançamento.
O que deu errado?
As linhas Etios e Yaris são exemplos de que nem tudo que a Toyota no Brasil lança é um grande sucesso. Alguns fatores ajudam a explicar esse fenômeno.
No caso do Etios, não havia uma reputação formada já antes da chegada ao Brasil, algo que poderia ter ajudado a despertar o desejo pelo carro – apesar do visual polêmico. O modelo, mundialmente, era um reles desconhecido. A falta de reconhecimento internacional do produto era um fenômeno oposto ao que ocorreu com o Corolla.
O sedã médio da Toyota é mais que um carro, é uma marca mundial aclamada. O Corolla, um dos mais vendidos do planeta, já teve diversas gerações e construiu sua reputação ao longo de décadas. Isso aumenta o desejo do consumidor.
Hilux e SW4, embora mais recentes, também conseguiram construir essa reputação. Esses três carros vendem mesmo quando são menos tecnológicos – e muitas vezes mais caros – que a concorrência. Um exemplo desse fenômeno é a antiga geração do Corolla, oferecida no Brasil até o ano passado.
Mas não é só isso que explica a rejeição, pois Yaris já era uma marca mundial forte, vendida em diversos países. Trata-se de um modelo global da Toyota.
Aí entra o segundo fator. Em segmentos de menor valor agregado, o cliente parece não estar disposto a pagar mais por uma relação preço-equipamentos inferior, algo que costuma ocorrer frequentemente com os modelos da Toyota.
O Yaris, um modelo não alinhado ao oferecido na Europa, mercado mais próximo ao brasileiro, foi lançado por preços semelhantes ao do Polo (que era então uma das referências do segmento). Porém, com menos tecnologia e lista de itens mais modesta.
SUV será Corolla ou Yaris?
E então chegamos ao novo SUV. Será que ele terá o destino do Yaris ou do Corolla? Para o primeiro caso, conta o fato de o modelo que será sua base, o Raize, ser um reles desconhecido, sem credibilidade mundial conquistada ao longo dos anos.
Além disso, é um produto originário da Índia, como o Etios. Diferentemente do C-HR, aqui não temos um produto Toyota de reputação global.
Por outro lado, há elementos que mostram que, com o SUV compacto, a Toyota parece ter aprendido com os erros do passado. Ao que tudo indica, ele usará a plataforma TNGA, a mesma do Corolla – não a das linhas Etios e Yaris.
Isso significa uma aproximação com o sedã médio mais vendido do mundo, movimento contrário ao da concorrência, que cria seus SUVs compactos a partir de carros de entrada. Além disso, o novo Toyota poderá, como o três-volumes, trazer tecnologia híbrida. Isso o colocaria, junto com o Kicks (cuja versão eletrificada será lançada neste ano), com uma vantagem e tanto.
O Corolla mostra que o brasileiro está aceitando bem o carro híbrido com valores competitivos. O sedã eletrificado é um sucesso, e uma das razões é o fato de custar o mesmo que sua versão equivalente com motor a combustão – embora seja um pouco menos equipado.
Além de representar economia de combustível, o carro híbrido tem uma grande vantagem para o maior mercado de carros do Brasil, a cidade de São Paulo: livra o consumidor do rodízio municipal.
Com o Corolla, a Toyota parece ter aprendido também uma segunda lição. O posicionamento de preços, finalmente, veio equilibrado. O carro não tem relação preço-equipamentos pior que a da concorrência. Espera-se que a mesma estratégia seja adotada para o SUV compacto da marca.
Mas claro que, para fazer sucesso, o derivado do Raize terá de ter dois atributos indispensáveis no segmento: espaço interno e porta-malas. O carro indiano é pequeno, com 4 metros apenas – ante os cerca de 4,25 metros dos principais concorrentes.
O porta-malas tem pouco mais de 350 litros, capacidade baixa para o segmento. A boa notícia é que a plataforma TNGA é modular, permitindo ganho de dimensões e porta-malas sem grande malabarismo.
A partir do cenário acima, qual é sua aposta? O SUV compacto da Toyota vem ameaçar os líderes? Ou será uma coadjuvante, lutando contra modelos do pelotão intermediário (como EcoSport, Captur, Duster e C4 Cactus, entre outros)?