Como brasileiro bairrista, pensei em usar o título “o melhor país do mundo para o veículo elétrico”. Afinal, o Brasil tem uma matriz elétrica predominantemente limpa, com 82% da energia gerada por fontes renováveis, sendo 61,1% oriundos de geração hidráulica. Considerando que a geração solar e eólica responde por pouco menos de 10% do total, ainda temos um gigantesco potencial de crescimento dessas fontes limpas. Logo, um dos principais argumentos contrários aos veículos elétricos, a de que utilizam energia proveniente de fontes não renováveis e poluentes, não se aplica a nossa realidade.

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Mas, tive que deixar de lado o bairrismo, pois ele pode ter efeitos perversos e contrários à expansão dos veículos elétricos em nosso país. Vejam: somos o país dos biocombustíveis. Principalmente, do etanol. Ainda era criança, mas me lembro dos primeiros anos do Proálcool, na década de 70. Foi uma resposta contundente de nosso governo à crise e à dependência do petróleo. Hoje, precisamos ter a mesma atitude inovadora e corajosa e planejar a eletrificação da nossa frota de veículos leves, pesados e de transporte público. Não se vira a chave, de uma hora para outra, em um país com mais de 60 milhões de veículos em sua frota. Mas, no Brasil, o apego nacionalista aos biocombustíveis parece ter se tornado um dos principais obstáculos para que isso aconteça. Biocombustíveis poluem menos do que combustíveis fósseis? Sem dúvida! Mas, um carro 100% elétrico polui muito menos ainda, mesmo considerando todo seu processo fabril. Se falarmos em eficiência energética, então, é covardia: o etanol gerado em um ano pela cana-de-açúcar plantada em uma área de um hectare permitiria que um carro flex desse uma volta e meia em torno da Terra. Se a mesma área fosse ocupada por painéis solares fotovoltaicos, a energia gerada em um ano seria suficiente para um carro elétrico dar 134 voltas em torno do nosso planeta!

Ao contrário de países europeus e alguns estados norte-americanos, onde os governos criaram políticas de incentivo à aquisição de veículos elétricos, o governo brasileiro deveria criar políticas de incentivo à produção desses veículos. Somos o mais importante polo automotivo da América do Sul. E exportamos veículos. Se Europa e EUA estão banindo os veículos movidos a combustíveis fósseis e acelerando a adoção dos elétricos, para quem vamos exportar? Até nuestros hermanos vão perceber que motores à combustão estão com os dias contados e deixarão de importar do Brasil. Pior: países como Colômbia e Chile já estão à frente do Brasil no que se refere à mobilidade elétrica. Tomarem nosso lugar de protagonistas no setor automotivo, em um breve futuro, é uma possibilidade cada vez maior enquanto não abraçarmos a mobilidade elétrica de verdade.

Além da coexistência por décadas de veículos à combustão e veículo elétrico em nosso país, o que assegura um bom mercado interno para nossos biocombustíveis, também poderíamos exportá-los e gerar divisas. Tudo envolve planejamento, ação e coragem. Mas sou otimista: negar a realidade de que o Brasil é o melhor país do mundo para os veículos elétricos (ops, não me aguentei) é um esforço muito maior do que o de, simplesmente, abraçar essa realidade.

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