O carro movido a álcool — hoje o popular etanol — completou 40 anos no último dia 19 de setembro, tendo surgido depois da criação do Proálcool pelo governo federal em 1975, como consequência mais visível do explosivo aumento dos preços do petróleo determinado pelos produtores do Oriente Médio.
Uma causa secundária do Proálcool foi a enorme superprodução de cana-de-açúcar, sobretudo no Sudeste e no Centro-Sul, resultante de uma política de governo anterior a 1964 que financiou a expansão dos canaviais sem cumprir a promessa de ajudar a aumentar a capacidade de moagem do setor industrial.
O desastre dos excedentes da gramínea que não tinha onde ser processada foi trágico. Em agricultura, excedentes grandes são muito mais prejudicais do que a escassez, porque essa se resolve em uma única safra, enquanto aquela pode durar muitos anos até ser absorvida pelo mercado, durante os quais os preços despencam produzindo grande quebradeira no setor privado.
O Proálcool é uma história exitosa, eminentemente brasileira, solução que causou admiração mundo a fora: fomos o único país a encontrar uma alternativa criativa e sustentável para a crise do petróleo.
O carro a álcool foi fruto de um acordo entre a indústria automobilística e o governo. Nos primeiros anos (1976/77) a mistura levava 10% do etanol e hoje, desde 2015, é de 27%. E foi o pai do carro flex, adotado em março de 2003, que admite o uso de qualquer porcentagem mistura de gasolina e etanol hidratado.
Resultados macroeconômicos
Desde a sua criação já foram vendidos mais de 32 milhões de veículos flex, a maior frota desse modelo em todo o mundo. E com resultados socioeconômicos extraordinários para o País.
Por exemplo: desde a criação do carro a etanol até o ano passado, deixamos de importar mais de 3 bilhões de barris de gasolina, o que equivaleria, segundo a consultoria Datagro, a uma economia de US$ 506 bilhões ao preço constante de dezembro de 2018!
A expansão dos canaviais e da indústria sucroalcooleira criou mais de 1 milhão de empregos diretos e indiretos, sem contar os das fábricas de automóveis. Mais recentemente essa grande força de trabalho teve expressivo aumento de massa salarial, com a mecanização do segmento (que reduziu o número de trabalhadores rurais sem qualificação e aumentou o de qualificados) e com a adoção de práticas de gestão modernas e mais eficientes.
Há um efeito adicional muito importante do ponto de vista da saúde pública. O etanol emite apenas 11% do CO2 emitido pela gasolina, o que traz uma significativa melhoria na atmosfera respirada nos grandes centros urbanos. Isso fez que a cidade de São Paulo, por exemplo, tenha reduzido a poluição do ar e as doenças pulmonares.
Mas houve incrível reação negativa ao Proálcool no seu lançamento: uma gritaria de que todo mundo plantaria cana e faltaria comida. Tínhamos naquele ano então menos de 4 milhões de hectares com cana. Hoje temos mais de 9 milhões de hectares de canaviais e, dos anos 1970 para cá, deixamos de ser importadores de alimentos para sermos dos maiores exportadores do mundo. Houve na verdade uma sinergia entre a agricultura de alimentos e a energética, ditada por inovações tecnológicas.
Ações de alguns governos foram trágicas para o setor, como recentemente, quando houve controle artificial do preço da gasolina para segurar a inflação, destruindo simultaneamente o valor de mercado da Petrobrás e grande parte da indústria sucroenergética.
Uma nova fase
Mas estamos agora diante de uma crescente indústria de etanol de milho, de biodiesel, aumentando a parcela renovável de nossa matriz energética, já muito maior que a do resto do mundo. E estamos diante da implementação do RenovaBio, um programa governamental que dará previsibilidade ao setor, acabando com intervenções nefastas de governo como a referida.
Com isso ganhará o País. Mesmo o carro elétrico, tão propagandeado globalmente, encontrará nos nossos biocombustíveis um excelente elemento de composição: o carro híbrido movido a etanol/eletricidade está sendo lançado pela Toyota no Brasil. Eis uma ótima maneira de se comemorar 40 anos de idade.