O Centro Histórico de Salvador, patrimônio cultural da humanidade, está longe ser um espaço acessível para pessoas com dificuldade de locomoção. Isso porque as conhecidas ladeiras e as ruas coloniais, com o piso em mosaico de pedras, são obstáculos para quem tem mobilidade reduzida. Essa barreira, porém, agora será superada graças a um roteiro especialmente pensado para esse público: um tour utilizando o carro elétrico do Casarão 17, que acomoda pessoas com alguma deficiência física.

O passeio, que sai do Casarão 17, no Terreiro de Jesus, e passa por locais como a Casa do Olodum, o Museu da Cidade, a sede do Projeto Axé e o Museu Afro-brasileiro, leva os turistas na companhia de um guia que mostra e explica as principais características arquitetônicas e históricas da região. Em um primeiro momento, o carro só não vai ao Santo Antônio Além do Carmo por conta das obras no local. Mas, quando as reformas forem concluídas, será mais um destino a ser visitado.

Ao longo do dia, são quatro tours disponíveis para quem quiser fazer esse ‘rolê’ sobre rodas, com partidas às 9h, 10h30, 15h e 16h30. O passeio é vendido de maneira coletiva e custa R$ 200, cerca de R$ 40 para cada um dos clientes caso o grupo tenha cinco pessoas. Há uma vaga a mais sempre disponível para pessoas em cadeiras de rodas. Ou seja, com a vaga para cadeirante, o carro tem capacidade para transportar até seis pessoas.

São quatro tours diários pelo Centro Histórico (Foto: Nara Gentil/CORREIO)

Opção viável

Apesar da iniciativa ser nova – foi lançada em 21 de setembro -, já tem soteropolitano que passeou pelo centro histórico, coisa que não poderia fazer antes. Esse é o caso de Marília Cavalcante, 56 anos, arquiteta e urbanista que tem sequelas de  poliomielite – doença contagiosa aguda que pode provocar paralisia – e precisa de uma bengala e uma órtese para se locomover, o que a impossibilitava de fazer uma visita ao lugar que tanto gosta. “Hoje, é muito difícil pra mim circular pela região que faz parte da minha vida e eu adoro. No centro histórico não tem acessibilidade e isso dificulta as coisas pra quem tem problemas para se locomover. O tour acessível com o carro é uma iniciativa louvável que atende todas pessoas, independente da sua condição de mobilidade”, diz.

A arquiteta e urbanista conta que a experiência de fazer um passeio turístico por toda a região foi maravilhosa. “Fiquei encantada com o tour acessível. Ele traz consigo um desenho universal onde os produtos também são para nós, com dificuldade de locomoção. Espero que outros empresários façam o mesmo, já que as pessoas com deficiência também são consumidores”, declara.

Marília, de máscara vermelha, ficou encantada com o passeio de carro elétrico no Centro Histórico (Foto: Reprodução/Acervo Pessoal)

Quem também já deu umas voltinhas pelo CHS foi Verônica Almeida, 45, atleta profissional e cadeirante que contou para a reportagem do CORREIO que, antes do tour, não ia ao Pelô por conta do desagaste que é pra pessoas com mobilidade reduzida circularem por ali. “Como portadora de deficiência, eu não tinha tanto acesso à boa parte dos lugares do Pelourinho. Já é muito complicado de sair de casa, em lugar sem acessibilidade, é ainda pior. Eu dificilmente vou ao Pelourinho porque é um lugar que não favorece a visita porque, apesar de ter um ou outro ponto com acesso tranquilo, o percurso para chegar é impossível pra quem é cadeirante. Então, o projeto foi super importante pra mim porque finalmente pude estar em um lugar tão bacana e importante sem qualquer problema”, relata.

Leonardo Régis, diretor do Casarão 17 e idealizador da proposta, afirma que as pessoas com dificuldade de locomoção eram o principal motivo para criação do projeto. “https://www.correio24horas.com.br/”A gente pensou o tour acessível não só para os turistas, mas também para os soteropolitanos que precisarem disso para conhecer melhor o CHS. Muitas pessoas que têm dificuldade de locomoção, como cadeirantes e idosos, chegavam centro histórico e não podiam contemplar ele como todo. Eles ficavam limitado à alguns pontos específicos da região. Isso nos incomodou e fez com que a ideia do projeto nascesse”, conta.

Leonardo Régis afirma que o projeto é direcionado, principalmente, à pessoas com mobillidade reduzida (Foto: Nara Gentil/CORREIO)

Adaptações sanitárias

A ideia do projeto surgiu ainda em 2019 e, por isso, teve que passar por adaptações que fazem com que o passeio nos carros seja alternativa segura durante a pandemia. Em vez de adquirir mais carros ou veículos maiores, a administração iniciou o tour acessível com apenas um veículo, com espaço para cinco pessoas, além do guia turístico que dirige o automóvel.

Além da higienização do veículo entre as turmas de visitantes, há também a necessidade dos interessados passarem por aferição de temperatura. Eles também recebem álcool para passar nas mãos antes de subir no carro. “Todo mundo tem que fazer a sua parte. As pessoas que entram no carro precisam ter esses cuidados para deixar a viagem mais segura pra mim e para eles. Até ando com álcool no carro para oferecer no meio do caminho já que eles descem e vão até os pontos turísticos. É o que a gente precisa fazer por hora pra garantir que todo mundo fique bem”, afirma Félix Ferreira, guia turístico do CHS há 22 anos e piloto do carrinho.

Félix é o guia turístico que pilota o carrinho (Foto: Nara Gentil/CORREIO)

Translado

Não é só para os tours que o carro elétrico do Casarão 17 está funcionando. Segundo informações da direção, o veículo também serve de translado para transportar pessoas entre o Terreiro de Jesus e os hotéis, pousadas e estacionamentos da região. Quem quiser a carona de graça, só precisa mandar mensagem, pelo Whatsapp, para o número (71) 98802-4362 e informar a localização durante o horário de funcionamento do translado, que acontece das 12h às 14h45 e das 18h até o fim do expediente do estabelecimento. Para os que pouco conhecem a região, há ainda a opção de ir até o Casarão e solicitar a orientação do motorista do carro elétrico, que irá acompanhar os cidadãos até o estacionamento mais próximo e os trará de volta ao Terreiro de Jesus.

Segundo Leonardo, a disponibilização do translado tem o objetivo de conceder aos visitantes do CHS conforto e segurança na hora de chegar na região e incentivar, através de facilidades como essa, o fluxo de pessoas no local. “Infelizmente, a nossa região ainda tem essa marca da insegurança que é coisa do passado por aqui. Por isso, a gente tenta oferecer meios que deixem as pessoas mais animadas e seguras em passar por aqui e fazer com que a circulação aqui seja ainda mais fácil. É nossa resposta para desconstruir esse temor que muitos têm de circular por aqui”, explica.

Roteiro

Saindo do Terreiro de Jesus, o carro passa pelas ruas e pontos importantes do Pelourinho. Depois, segue viagem visitando vários lugares antes de chegar na agora reformada Praça Castro Alves para apreciar a vista da Baía de Todos os Santos e finaliza o percurso após passar pela Cruz Caída e Igreja de São Domingos.

Confira o roteiro completo do tour:

Pontos turísticos que são vistos no tour (Foto: Reprodução/Casarão 17)

*Com a orientação da chefe de reportagem Perla Ribeiro

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