RIO DE JANEIRO, RJ (FOLHAPRESS) – Aos 45 anos do programa Proálcool, o setor de cana-de-açúcar busca se lançar como alternativa às baterias no processo de eletrificação da frota mundial de veículos. A ideia é vender o modelo de células combustíveis como uma opção mais barata e menos poluente.

O programa que tornou o Brasil uma referência no uso de biocombustíveis para automóveis foi lançado no dia 14 de novembro de 1975 e, apesar de percalços pelo caminho, chega aos 45 comemorando a criação dos créditos de descarbonização e tentando encontrar seu espaço numa eventual popularização do carro elétrico.

“A mobilidade deste século vai ser plural, com uma pluralidade de rotas tecnológicas”, diz o presidente da Unica (União da Indústria de Cana de Açúcar), Evandro Gussi. “E, nesse aspecto, consideramos o etanol um combustível não só do presente mas do futuro.”

Disseminado no Brasil a ponto de praticamente banir o carro a gasolina do mercado –em 2020, apenas 3,1% dos carros licenciados no país usam exclusivamente o derivado do petróleo–, o etanol enfrenta o desafio de competir com a crescente busca pela eletrificação da frota, que já concentra grandes incentivos em países desenvolvidos.

As rotas tecnológicas mais usadas no momento ou reduzem a demanda por combustíveis, no caso dos híbridos, ou simplesmente eliminam a necessidade de combustíveis líquidos, como no caso dos veículos 100% elétricos. O setor defende, porém, que a célula combustível que produz hidrogênio a partir do etanol é mais eficiente.

A tecnologia, que ainda não tem produção em escala comercial, consiste em separar o hidrogênio do etanol e produzir eletricidade por meio de um processo químico realizado dentro do próprio veículo ou em postos de gasolina.

O setor defende que o modelo reduz a necessidade de grandes e caras baterias e evita a geração de energia por fontes fósseis para carregar os veículos. Além disso, poderia usar a infraestrutura de distribuição de combustíveis já instalada, sem necessidade de aportes em pontos de carregamento e na rede de distribuição de eletricidade.

“A questão da carga é muito complicada. Ela é demorada e, para acelerar o processo, precisa de potência muito alta nos postos de gasolina, o que demanda investimento na rede”, diz Luiz Augusto Horta Nogueira, pesquisador Núcleo Interdisciplinar de Planejamento Energético da Unicamp.

Horta, que já foi diretor da ANP (Agência Nacional do Petróleo), acredita que o modelo de células combustíveis deve ganhar espaço no mundo, principalmente nos maiores países, onde as distâncias percorridas prejudicam a opção pela bateria e a rede de energia é maior.

Enquanto a tecnologia não está disponível, o setor vem incentivando no Brasil a opção pelo híbrido flex, que usa gasolina e etanol em conjunto com um motor elétrico. Em 2019, a Toyota lançou o primeiro modelo do Corolla com essa tecnologia.

Os elevados preços ainda fazem dos carros elétricos um produto exclusivo para classes de maior renda, mas o setor espera uma renovação gradual da frota até a chegada da nova tecnologia, que vem sendo testada desde 2016 em um protótipo da Nissan.

“O Brasil tem todas as perspectivas para se transformar no grande centro de pesquisa e desenvolvimento de eletrificação a partir de célula combustível a etanol”, diz Gussi, da Unica, lembrando que o incentivo dado pelo programa Proálcool levou o país ao pioneirismo na difusão dos carros bicombustíveis.

O programa foi criado em 1975, mas a adoção do etanol como combustível veicular vem desde 1931, quando o governo Getúlio Vargas determinou a mistura de até 5% do biocombustível na gasolina. Entre 1931 e 1975, diz Horta, a mistura média ficou em torno de 7,5% –hoje, são 27,5%.

A criação do Proálcool teve como objetivo reduzir a dependência nacional de derivados de petróleo em meio aos choques de oferta dos anos 1970. Mas, nas últimas décadas, o setor vem sendo impulsionado pela preocupação cada vez maior com as emissões de gases poluentes e seus efeitos sobre o clima.

Em 2017, o governo Michel Temer lançou o Renovabio, programa que obriga as distribuidoras de combustíveis a compensar, pela compra de créditos de carbono, as emissões provocadas pelos derivados de petróleo que vendem.

O programa foi judicializado nesta semana por uma associação de distribuidoras que alega não ter condições de cumprir as metas de aquisição de créditos após a pandemia, mas o setor espera que a liminar seja derrubada e diz que os recursos são importantes para o fomento a novas tecnologias de biocombustíveis.

Em outra frente, trabalha para disseminar a produção de etanol no mundo, com transferência de tecnologia.



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